sábado, 26 de dezembro de 2009

IMPORTANTÍSSIMO! (OFF)

Seguinte, pessoal! Tô de férias e, amanhã às 5:30 da manhã, eu tô pegando a estrada pra São Pedro da Aldeia, aonde eu vou passar o Ano Novo e mais... Vai demorar pra eu voltar pra postar. Eu vou tentar arranjar um meio de postar de lá, mas as probabilidades são que eu só poste de novo daqui um bom tempo... Quem sabe eu poste algo dia 18, mas não é garantido. Então, as previsões são só pra dia 1º de Fevereiro. Dia 1º eu volto e aí é garantido que, no mais tardar dia 2, eu volto a postar. Enfim, vou curtir a vida que eu tenho fora da invasão de zumbis. Também aproveitem pra aproveitarem as férias e largarem do computador por algum tempo, hehehe... Deixei esse final assim pra ficar um suspense e pra manter vocês com vontade de saber, pra que não se esqueçam.


Ah, sim... A partir de agora, eu só vou avisar as coisas pela comunidade, então, por favor, entrem lá, pra se manterem informados. Aqui vai o link novamente: http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=97152175


Bom, obrigado a todos, feliz 2010, muita felicidade, alegria e vamos torcer os dedos pra que não ocorra uma invasão de zumbis esse ano (ou ocorra, pensando melhor)

Até, no mais tardar, 2 de Fevereiro!
Flws!


Bjotas, abracos e apertos de mão

Hugo Mendes de Oliveira

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Capítulo 14- Inferno

Assim que descemos as escadas, a gente viu: Dinamites, nas colunas. Muitas, muitas, muitas, muitas. Mais do que eu já havia visto. Todas elas estavam conectadas a um dispositivo que estava dentro da garagem. As dinamites junto com a gasolina dos carros e etc... Ia dar uma bela explosão. Com certeza iria acabar com o prédio. Chequei o dispositivo e percebi uma antena. Provavelmente, a explosão seria comandada à distância. E já devia ter sido ativada, porque no exato momento em que eu peguei o dispositivo, eu vi um número piscando: 00:03:47. Eu soltei aquilo e saí correndo, puxei o Pedro e disse, enquanto corria:
-A gente tem 3 minutos pra cair fora! Essa merda vai explodir!

Ele arregalou os olhos e nós hesitamos um momento. Pouco tempo depois, corremos para o elevador da frente e chamamos. Graças a Deus, ele estava no térreo. Ele desceu os dois andares muito lentamente e, nós, apreensivos, ficamos apertando o botão e dizendo:
-Rápido, rápido!

A porta do elevador se abriu e a gente olhou para dentro: 2 zumbis. Entrei no elevador com o revólver levantado, apontado na cabeça do zumbi mais próximo, dando três tiros seguidos. O que foi uma merda, já que a arma deu um repuxo desgraçado e acertou meu nariz com força. Provavelmente quebrei o nariz, o que sempre fora um medo enorme meu. Mas estava desesperado e ignorei a dor. Acertei a cabeça de outro zumbi com o taco de beisebol. Pedro apertou o andar 13. Não havia tempo para nada. O elevador foi zubindo devagar e eu olhei para o espelho, machado com o sangue da cabeça do primeiro zumbi, rachado em vários lugares com os meus tiros. Vi que meu nariz sangrava muito, mas ao mexer nele, não senti nada se movendo. Graças a Deus. Então, o zumbi que eu acertei a cabeça com o taco de beisebol se mexeu, esticando a mão e segurando a perna do Pedro. A gente tinha esquecido de ver se ele estava morto! Caralho, como a gente é burro!
-Merda!- Eu gritei, atirando na mão do zumbi, pra que ele soltasse Pedro. Acertei a mão do zumbi. Ele soltou Pedro. Mas eu acertei também a perna do Pedro, atravessando bem o meio do osso. O zumbi se encolheu insitntivamente. Pedro deu um berro e... Desmaiou. Droga! O meu reflexo de tirar a mão do zumbi da perna do Pedro foi uma falha. A gente não ter checado se o zumbi tava vivo foi uma falha. A gente não ter checado a garagem tinha sido uma falha. Falhas, uma atrás da outra. Atirei com raiva na cabeça do zumbi, segurando a arma com as duas mãos. Uma poça de sangue se espalhou no chão. Eu tirei a camisa e amarrei na perna do Pedro, nervoso, tentando estancar o sangramento. Levantei ele com mais facilidade do que imaginei e lembrei: A adrenalina devia estar fazendo a festa nas minhas veias. O elevador finalmente parou e, com um chute, eu abri a porta. Eu gritei:
-Alguém abre a merda dessa porta pra mim, aqui é o Hugo!

Droga, a gente tinha se precavido demais. Até o Ivan e a Vany empurrarem os sofás para longe...
Ainda assim, parecia que eles não tinham ouvido. Chutei a porta com Pedro nos braços e gritei:
-Peguem as malas e saiam, é o Hugo, a gente tem que ir!

Eu ouvi eles começando a perguntar alguma coisa, mas eu gritei, interrompendo:
-Não tem tempo pra pergunta, caralho, só peguem as porras das malas e vamos embora! Depois eu explico- Um momento depois, adicionei- E desculpem pelos palavrões...

Eu tava irritado. Pedro estava começando a pesar nos meus braços. Então ele acordou. Me xingou de tudo quanto é nome e tentou ficar em pé. Eu coloquei ele no chão e deixei ele se apoiar no meu ombro. Ouvimos os sofás serem empurrados. Ouvimos a porta ser destrancada. Quanto tempo já teria se passado? A Vany e o Ivan abriram a porta e deram malas para mim. Obviamente, o Pedro não ia poder levar uma mala, então, pra não nos atrasar e nem nos sobrecarregar, a gente teve que deixar uma mala ali, uma das malas de comida. A gente foi para o elevador e eu fiquei feliz pela Vany e o Ivan não terem feito nenhuma pergunta. Eles sabiam que eu não iria brincar e que eu tava irritado, portanto resolveram deixar explicações para depois. Eu só reforcei que era importante a gente andar rápido. A gente chegou lá embaixo já devia ter passado uns 3 minutos, no mínimo. A gente tinha alguns segundos para sair da portaria, que não devia ter mais do que 10 passos. Saí do elevador atirando no vidro das portas da portaria para abrir espaço e não ter que só uma pessoa passar por vez. Devo ter dado uns 4 tiros. Os vidros foram ao chão abrindo muito espaço. pedro gemia de dor, eu mandei os dois correrem na frente. Eles ficaram em dúvida, mas eu já estava indo o mais rápido que conseguia segurando Pedro. Eles começaram a correr e passaram por nós e continuaram indo embora. Eu gritei:
-Corram por suas vidas!

E comecei a chorar, percebendo que não ia dar tempo. Então o Pedro começou a tentar correr também. Era agora ou nunca. Se ele não aguentasse a dor, nenhum de nós dois iria sentir dor, nunca mais. O Ivan já tinha aberto o portão do prédio com o controle remoto (aí, Ivan!) e estava correndo para longe, a Vany, um pouco ao seu lado. Eu e o Pedro saímos da portaria e estávamos descendo as escadas quando o prédio explodiu. Eu estava de costas, mas ouvi o barulho mais alto que já ouvi na minha vida. Não parei de correr. Mais ou menos ao mesmo tempo, ouvi o barulho novamente enquanto toda a vizinhança explodia sincronizadamente. Vários prédios e casas caíram, cada um levantando ondas de poeira inacreditávelmente gigantescas, eu diria uns 12 metros. Eu não ouvia mais nada, minha cabeça pareceu explodir também. Eu só ouvia um zunido muito alto. Um tremor gigantesco se fez sentir quando o prédio atingiu o chão, junto com outros tremores paralelos, causados pelo resto da vizinhança indo abaixo. A onda de poeira nos atingiu, cobrindo meu rosto, entrando nos meus olhos, narinas, orelhas e boca, enquanto eu gritava sem escutar minha própria voz. Eu sufoquei, tentando, em vão, limpar a garganta. Eu tentei abrir os olhos e senti eles lacrimejando, tentando limpar a poeira que se encontrava debaixo das pálpebras. Eu pisquei muito. Não via nada, não ouvia nada. Parecia que o mundo inteiro tinha sido abafado pela imensa nuvem de poeira. Parecia que só existia eu. Em toda a direção que eu olhava, eu só encontrava uma imensidão suja, de cor bege. Então, o zumbido começou a passar e a poeira começou a baixar. Eu tossi. Eu ouvi tosses ao meu lado. Eu falei alguma coisa, não me lembro o que. Com a mão, encontrei Pedro, caído. Toda aquela poeira podia ter infeccionado a perna dele, mas não havia nada que pudéssemos fazer além de esperar que o meu curativo tivesse tapado o ferimento. Eu ouvi, parecendo ao longe, alguém chamar meu nome e vi um vulto correr na minha direção. Ivan se agachou ao meu lado, ofegante. Eu olhei para os dois, cinzentos, cobertos por poeira. Olhei para os lados.
-Cadê vocês?- Ouvimos a Vany gritar.

Ivan se levantou e gritou:
-Aqui!

Ela veio correndo até nós. Nós quatro nos abraçamos e, agachados, começamos a chorar. Antes a gente tinha um local seguro. Uma base de operações, segura, com TV, água quente, camas confortáveis... Agora... Agora nós éramos 4 adolescentes soltos no meio de uma cidade zumbi, sem lugar para onde ir, sem nada além de nós e nossas malas. Tentei afastar da cabeça o máximo que pude o fato de minha casa, onde vivi a vida inteira, ter sido destruída. Éramos crianças, crianças inocentes no meio de um mundo de terror e morte. Pobres anjos no meio do Inferno. E os demônios não eram nem um pouco receptivos

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

C-C-C-COMBO BREAKER!!!! (IMPORTANTE, LEIAM!!)

Então, eu queria aproveitar esse espaço e esse dia especial pra dar uma quebrada nos capítulos e falar sobre umas outras coisinhas...

Primeiramente e, mais importante, eu queria dizer a todos vocês: Feliz Natal! Muita alegria, festas, sucesso e paz, enfim...

Segundamente, eu queria divulgar a comunidade do Cheiro de Podridão no orkut, que tem tópicos para entrevista com personagens (você pode perguntar coisas para os personagens, tanto o personagem Hugo, quanto Pedro, Ivan e Vany. Podem perguntar desde: "Qual foi o momento mais difícil pra você até agora?" até "Qual a sua cor preferida?"), tópicos para entrevista com o autor (Básicamente a mesma coisa, mas com perguntas SOBRE a série "Alguém vai morrer? Qual o capítulo que você mais gostou de escrever? E o que menos gostou? Quais seus planos pra Vany? E o Pedro? Por que o Ivan não ajudou em nenhuma batalha até agora? A história vai ter um fim?") também tem meus comentários, sobre cada capítulo, tem chat, tópico pra opiniões, críticas e sugestões, tem enquetes legais e tem também o mais importante, MUITO importante mesmo: O tópico de notícias. É por lá que eu vou avisar, por exemplo, quando saírem novos capítulos ou se eu tiver que passar um tempo sem poder postar, é por lá que eu vou avisar por quanto tempo e o motivo pelo qual não poder postar. Enfim, recomendo que vocês entrem na comunidade. Aqui vai o link:
http://www.orkut.com.br/Main#Community?cmm=97152175


Terceiro, é outra recomendação: A Série Amanhã, que foi a minha MAIOR inspiração pra criar o blog, inclusive com várias partes semelhantes. Muito boa leitura. Que fique gravado: Qualquer semelhança é mera homenagem.


Bom, pessoal, é isso. Eu queria bastante que vocês entrassem na comunidade porque, assim, vou poder me comunicar com vocês sem ter que dar essa quebrada na história (que, sinceramente, fica horrível). Enfim, beijotas, abracos, apertos de mão, Feliz Natal e até a próxima postagem!

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Capítulo 13- Más Notícias

Foi aí que eu me lembrei! E o apartamento vizinho ao da Vany? O 1801? A gente não verificou. Não adiantava nada termos limpado o caminho inteiro se, depois, no destino final, a gente pudesse morrer. A gente tava na frente da porta do meu apartamento quando eu toquei o ombro do Pedro e falei pra ele. A gente subiu de volta, começamos a ficar cansados de tanto subir e descer escadas. Eu tentei abrir a porta e, nesse exato momento, um zumbi pulou em mim. Eu coloquei o bastão debaixo do pescoço dele, enquanto senti o chão batendo nas minhas costas. Lutando para mantê-lo longe de mim, eu olhei em volta e vi que Pedro estava engatado numa outra luta com um zumbi. Merda, merda, merda! Se fosse um homem normal, eu podia ter dado uma joelhada no saco dele. Mas isso não ia adiantar de nada. O zumbi começou a babar em mim e eu me perguntei se o vírus podia ser transmissível por saliva, enquanto lutava para me desvencilhar. Eu rolei para o lado e acabei em cima do zumbi, minhas pernas prendendo os seus braços. Sorte. Eu desci o cabo do taco na testa dele repetidamente e, por fim, ele parou de se mexer. Eu ouvi um tiro e fiquei em pé num salto. Militares? O quê? Outro tiro. Não conseguia ver o Pedro, ele devia ter entrado mais pra dentro do apartamento. Eu coloquei a cabeça pra dentro da porta e vi Pedro levantando-se do chão, um corpo com um tiro na barriga e outro no pescoço, jorrando muito sangue, caído no chão. Pedro tinha um revólver na mão. Eu olhei e, atrás dele, tinha um cadáver com um tiro na testa e uma mordida no ombro. Ele disse que achou o revólver na mão do cadáver. Enquanto entramos no banheiro para nos lavar do sangue e da saliva, começamos a conjecturar. Provavelmente o casal tinha uma arma na casa. O homem e a filha foram infectados e viraram zumbis e a mulher não. Ela correu para a arma pra se proteger, mas quem sabe ela não soubesse a usar, ou tivesse faltado coragem na hora de atirar no rosto do marido ou da filha. Então ela foi mordida, mas se matou com um tiro na cabeça, pra impedir que seu corpo virasse um zumbi. Ficamos felizes com o achado. Só tinha 15 balas, mas já era alguma coisa. Pegamos o revólver e fomos novamente para o meu apartamento.
A gente chegou no meu andar e fez a batida secreta. O Ivan veio abrir com cara de enterro. A Vany estava no sofá, com a mão na boca. Rapidamente, a gente percebeu que alguma coisa tinha acontecido. Ivan começou a contar:
-A gente tava vendo TV, com volume baixo. O jornal disse algumas coisas... Algumas coisas sobre a invasão. Coisas terríveis.

Meu coração começou a bater forte dentro do peito. Eu olhei pra Vany, mas ela tava em estado de choque. Eu comecei a falar, mas a voz não saiu. Eu limpei a garganta e tentei de novo:
-O que foi, Ivan? O que eles disseram?

Ele olhou pra mim e disse:
-Não é só mais no bairro. Eles tentaram controlar, mas a cidade inteira foi tomada. A cidade inteira foi isolada.- Eu senti minha vista escurecer "A cidade inteira? Puta que o pariu, isso tá ficando maior do que eu imaginei"- Quem quiser sair deve fazer uma ligação e eles enviarão um time para buscar a pessoa ou pessoas. Eles realizaram buscas na maioria dos bairros, porém sabiam que iam acabar deixando gente pra trás - "Por isso eles não cortaram a eletricidade! Eles ainda vão continuar a transmitir notícias para outros sobreviventes"- Só que, óbviamente, eles vão realizar testes pra ver se a pessoa tá infectada antes de levá-la embora. Por enquanto, a cidade está apenas isolada. Eles conseguiram manter a doença aqui dentro, mas estão discutindo uma solução. Procuram uma cura, cientistas e médicos do mundo todo tão reunidos. Mas...

Eu senti a minha pressão abaixando enquanto eu sentei ao lado da Vany:
-Mas?

Ele disse:
-Se não acharem cura, houveram boatos de uma tal de Operação Arrasa-Quarteirão. Destruir a cidade inteira, não sobra nada.

Eu arregalei os olhos e fiquei boquiaberto. A Vany começou a chorar no meu ombro e eu abracei ela, como se aquilo pudesse protegê-la de tudo. Eu fiquei sem palavras. Pedro começou a se revoltar, gritando palavrões, xingando Deus, Diabo, o mundo todo e mais uns 3. Meu cérebro parecia que tinha parado de funcionar. Eu não conseguia pensar em nada, absolutamente nada. branco, estado de choque.
-Quanto tempo temos?- Pedro perguntou

Ivan respondeu:
-É bastante tempo, temos até os cientistas darem um resultado e, se for negativo, ainda temos mais algumas semanas até aprovarem a operação. E daí até realizarem, deve dar, no máximo um dia ou dois.

A gente ficou em silêncio por um tempo. O Pedro foi se isolar, revoltado. Ivan ficou meio desconfortável, sem saber o que fazer. Eu e a Vany ficamos abraçados, sentados no sofá.

***
No final, a gente decidiu simplesmente continuar o que a gente tava fazendo. Resolvemos limpar o prédio, dessa vez de baixo pra cima, desde a garagem. Duvidamos que haveria algum zumbi na garagem, mas quem sabe a gente achasse alguma arma. Eu e o Pedro descemos lentamente as escadas. Vimos vários relances de portas meio abertas, mas, felizmente, não encontramos nenhum zumbi. O Pedro deixou o revólver comigo, porque eu tinha melhor pontaria. Então meu taco de beisebol ficava numa mão enquanto o revólver ficava na outra. Não daria pra usar os dois ao mesmo tempo, mas ficaria mais fácil de trocar. Se eu visse um zumbi longe, largava o taco. Se um zumbi chegasse perto, taco na cabeça. Prático. A gente desceu e chegou à garagem. E foi aí que a gente descobriu por que os militares deixaram tantos zumbis perambulando no prédio. Foi aí que vimos as coisas que seriam causa dos nossos pesadelos por anos ainda. Foi aí que sentimos o maior medo de nossas vidas. Foi aí que se abriram as portas do Inferno

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Capítulo 12- Caça aos Zumbis

Eu e o Pedro descemos e resolvemos ver cada apartamento entre o meu e o da Vany antes de chamar os dois. Assim, eles teriam caminho livre para ir e voltar, se nenhum zumbi aparecesse por lá depois. Enfim, a gente foi pro andar número 17. Ficamos abrimos a porta que também estava destrancada (Será que tanta gente assim esqueceu de trancar as portas?) e entramos no apartamento. Assim que abrimos a porta, vimos um zumbi caído no chão, um tiro no meio da testa.
-Os militares- Eu disse, meio que por reflexo. Deviam ter chamado o apartamento e o zumbi não desceu, então eles invadiram o apartamento e o mataram. O apartamento devia estar seguro. Damos uma vasculhada, só pra garantir, e procuramos por possíveis armas. Encontrei uma coisa legal, um taco de beisebol oficial, de madeira maciça. Sorri. Essa sempre foi a arma que eu disse que queria ter se estivesse numa invasão de zumbis. Afinal, antes da invasão, eu era fascinado por zumbis e conversas assim rolavam de vez em quando entre meu grupo de amigos. E, como arma, eu sempre escolhia o taco de beisebol. Ele era pesado, comprido, resistente, fácil de manejar, enfim...
Eu troquei o taco de beisebol pelo taco de Bet's, que eu entreguei pro Pedro. Peguei outra faca na cozinha. Só nessa olhada superficial, deu pra ver que o cara que morou lá era maluco por esportes, ele tinha de tudo. O Pedro pegou outra raquete de tênis (eu já tinha uma). Lá tinha um monte de coisa, incluindo halteres, sacos de pancada, luvas de boxe, enfim. Felizmente eu sabia que ele não tinha mexido no taco de beisebol, então ele provavelmente não estava infectado, porque este ficava num pedestal, com uma assinatura de um astro do beisebol gravada na madeira. Devia ser como um troféu pra ele. Dava até pena pegar uma coisa dessas sem lavar as mãos, tão lustrosa, tão bem cuidada...
Bem, nós voltamos para o lado de fora. Fomos no outro apartamento. Esse estava trancado. Após alguns chutes na porta, nós desistimos de tentar abrí-la. Pedro disse:
-Bem, se a gente não consegue abrir, duvido que um zumbi consiga.- Eu assenti e descemos para o andar número 16. A gente tentou abrir a porta dos fundos, mas estava trancada. Fomos abrir a porta da frente, que estava trancada também. Que droga! No outro apartamento, no entanto, conseguimos abrir a porta. Entramos. Com o taco de beisebol levantado, eu fui na frente. Atrás, Pedro segurava o taco de Bet's com a mão esquerda (Ele é canhoto) e a faca longa na mão direita. Uma sala se abria ao meu lado, então, encostado na parede, eu fui andando lentamente até virar a esquina. Nada. Então, no corredor, eu vi: 3 zumbis, andando lentamente. "Como os militares deixaram esses passar?" Eu me perguntei, mas isso podia ficar pra depois. Entre os zumbis e eu havia uma mesa grande. O apartamento era assim: Na entrada, uma saleta com um tapete e uma mesinha com flores de plástico. Dessa saleta, virava-se numa sala com uma mesa grande. Depois da mesa grande, havia o corredor. No meio do corredor, três zumbis estavam se arrastando, em direção à mesa. Eu subi em cima da mesa e chutei um vasinho que estava lá em cima na direção de um zumbi. O vaso bateu nele sem muito efeito e se espatifou no chão. Pedro correu dando a volta na mesa e ficando colado na parede que dobrava para o corredor, trocando a faca pra mão esquerda, ficando fora da vista dos zumbis. Eu desci da mesa e logo o 1º zumbi veio, fazendo um barulho com a garganta, parecido com o barulho que os gatos fazem. Eu revirei os olhos e acertei ele com força, na cabeça, com facilidade. Ele caiu para o lado, batendo a cabeça na parede do corredor, porém não parecendo ter acabado. Para não estragar o esconderijo do Pedro, eu acertei mais dois golpes na cabeça do zumbi com o taco e ouvi um barulho de ossos quebrando. O outro zumbi já estava praticamente em cima de mim. Eu tinha me distraído e aí o Pedro teve que intervir. Ele virou a esquina com um movimento rápido, enfiando a faca na boca aberta do zumbi. Eu vi a faca saindo pelo outro lado e o Pedro largando ela enquanto o zumbi caía no chão, se debatendo debilmente. Com o taco de Bet's, ele acertou a cabeça do zumbi, acertando-a na parede com o impacto e mais um zumbi foi ao chão. Eu me endireitei (estava meio que agachado por ter atacado um zumbi caído com o taco) e sorri para Pedro. Ele se abaixou para pegar a faca da boca do zumbi e eu comentei:
-Cara, tenta se manter o mais longe possível da boca... É perigoso.

Ele retrucou:
-Funcionou, não funcionou?

A gente explorou mais o apartamento. Não tinha mais nenhum zumbi. Não tinha nenhuma arma diferente, então a gente deixou lá. Depois a gente podia pegar. Saímos do apartamento e descemos para o andar nº 15. No meio das escadas, a gente encontrou outro zumbi. É impressionante como eu comecei a parar de descrever os zumbis. Eu não via eles mais como pessoas que tinham morrido, eu via eles como simples inimigos. Eu me sinto mal por isso. Acho que devia ter mais respeito com as pessoas que morreram, principalmente os meus vizinhos. Provavelmente na hora eu reconhecí eles, mas agora eu já não me lembro muito bem. Eles parecem que ficaram meio borrados na minha memória. Sem rostos ou características marcantes. Eu me sinto mal e, ainda assim, não consigo me lembrar deles. Eu queria tomar um momento da narrativa pra dizer que eu gostaria de poder honrar a morte de cada pessoa. Cada pessoa que caiu vítima do vírus. Cada pessoa que foi mordida, contaminada ou mesmo morta pelos malditos militares. Cada vítima desse evento infeliz. E acho que era por esse mesmo motivo que eu matava os zumbis com tanto ódio. Eles eram culpados. Não totalmente, mas em parte. Eles eram tanto a causa quanto o produto da situação. Vai ver foi por isso que eu esqueci da vida passada das pessoas que eu reconhecia. Isso só iria dificultar vingá-las. Só faria peso na minha consciência por estar destruindo os corpos delas. Foi com esse pensamento que eu acertei a cabeça do zumbi com a ponta do taco. O zumbi caiu para trás e rolou o resto da escada, ficando caído no chão depois, tentando se levantar sem sucesso. Eu desci a escada e acertei a cabeça do zumbi com o taco mais vezes do que o necessário. Depois, com um último chute no corpo inerte do zumbi, eu fui para o corredor. Era o 14º andar. Tentei abrir uma das portas, mas não consegui. Tentei abrir a outra e não consegui também. Pedro disse que uma das portas do fundo estava aberta. Nós entramos. Não havia ninguém no apartamento. Aparentemente, esse foi um daqueles que foi evacuado com sucesso. Procuramos por toda a parte por uma arma diferente, mas não havia nada fora do comum. Só mais uma casa normal. Nós descemos para o meu apartamento e, no caminho, eu cuspi no corpo do zumbi, desgostoso. A primeira parte da missão havia sido cumprida. E eu não me sentia nem um pouco melhor. Na verdade, eu me sentia pior. Cada vez que eu matava um zumbi, passava pela minha cabeça que eu não teria que estar fazendo isso se esse maldito vírus não estivesse solto por aí. O mesmo maldito vírus que estava dentro de mim. Dentro de mim e dos meus amigos. Eu não ia deixar que ele fizesse mal a nenhum de nós. Mentalmente, eu me perguntei se eu seria capaz de nos proteger. Não houve resposta.

domingo, 20 de dezembro de 2009

Capítulo 11- Inexperiência

A gente dormiu de um jeito engraçado. O Pedro só dormia no meu sofá, não interessava se tinha cama, travesseiro, coberta, não... Ele só pegava no sono naquele sofá. O Ivan dorme no chão, em cima de um colchão e a gente ficou arrumando a cama dele, depois de escovar os dentes. Era engraçado como, nessas situações, a gente lembrava de ser responsável, porque ninguém mais seria responsável por nós. Se quiséssemos sair saudáveis dali, a gente tinha que fazer essas coisas.
Eu e a Vany ficamos no meu quarto, conversando. Eu tinha arrumado uma cama no chão pra mim e tinha deixado ela ficar com a minha cama, porque era mais confortável. A gente ficou conversando um tempão até que ela pegou no sono, enquanto eu falava algo sobre teatro. Eu comecei a rir quando percebi que ela tinha pego no sono e cobri ela delicadamente, depois me deitando e dormindo também.

***
No dia seguinte, após nos fartarmos com um pedaço de pizza que havia no congelador, nós começamos a nos preparar. Eu e o Pedro distribuímos as armas assim: Eu fiquei com 1 faca serrilhada (presa num cinto), 1 taco de Bet's(na mão), 1 raquete de tênis (presa nas costas mal e porcamente com outro cinto) e 1 cabo de vassoura (também preso nas costas). Pedro ficou com 1 taco de bet's (na mão), 1 cabo de vassoura (nas costas), e a faca pra cortar peru (mais ou menos 30cm de lâmina, na outra mão). A gente terminou de nos arrumar e fomos para a sala, aonde encontramos o Ivan e a Vany. Eu abracei o Ivan e o Pedro abraçou a Vany. Não pude deixar de sentir ciúme, mas tudo bem. Depois a gente trocou e a Vany sussurrou no meu ouvido:
-Hugo, em caso de vocês não voltarem- Ela começou a chorar enquanto tentava continuar, mas eu a interrompi olhando em seus olhos e secando uma lágrima.
-Nada disso, o que você devia dizer é: Até logo.
Ela sorriu e disse:
-Tá... Até logo.
Eu olhei para o Pedro e apertei a mão dele, dizendo:
-Vamos caçar zumbis.
Tem vezes que eu faço umas coisas que me surpreendem, lembrando agora que eu tô escrevendo, eu só posso dizer: Foi a despedida mais massa que eu já fiz na minha vida! Hahahahahahaha...
***
Eu e o Pedro resolvemos não criar confusão, éramos nós dois que tínhamos mais ódio dos zumbis. Portanto, a gente não ia fazer de cada morte um evento, não iríamos chorar nem nada assim. Aquelas pessoas já tavam mortas, a gente só ia acabar com uma ameaça. A gente resolveu começar pelo apartamento mais importante: 1802, o apartamento da Vany, porque assim a gente poderia mandar os dois lá pra cima pra eles já começarem a arrumar as coisas de lá. Nós subimos e encontramos a porta aberta. Merda. A gente tinha esquecido de fechar também. Droga! Agora o zumbi da Dona Valquíria poderia estar em qualquer lugar. Então nós começamos a vasculhar o apartamento e, no quarto dela, nós a encontramos, do pior jeito possível. A gente não tava tomando muito cuidado, então a gente abriu a porta completamente desprevenidos. Ela pulou em cima do Pedro, que quase levou uma mordida, ela estava caída em cima dele, que estava de costas pro chão. Eu peguei a faca serrilhada e enfiei com força na parte detrás da cabeça dela e no mesmo instante, ela parou e caiu, se debatendo debilmente, enquanto Pedro a empurrou para o lado. Eu chequei ele por mordidas, mas, Deus sabe como, ele não tinha. Não sabíamos como nos livrar do corpo, porque a Vany não ia querer ver o corpo da avó. Daí o Pedro teve a ideia:
-Vamos jogá-lo pela janela.
Eu dei de ombros "Por que não?", pensei. E assim, nós pegamos o cadáver que ainda se debatia e o atiramos, com dificuldade pela janela. Foi só aí que eu lembrei.
-Merda! Esqueci de tirar a minha faca!
Bom, não era exatamente um problema, mas foi uma arma descartada. Droga, a gente tinha que tomar mais cuidado. O Pedro quase tinha levado uma mordida. Perdemos uma arma à toa. A gente ainda era inexperiente nisso. A gente ainda era, acima de tudo, apenas adolescentes. Nos próximos andares, nós teríamos que levar essa "caça-aos-zumbis" mais a sério. Se não, quem sabe a gente nunca retornasse ao meu apartamento.

sábado, 19 de dezembro de 2009

Capítulo 10- Coisas Simples

Aí a gente fez uma coisa que parecia que era coisa de outro mundo, mas achamos seguro. As portas estavam seguras, estávamos fortemente armados (relativamente falando) e todos nós conhecíamos o apartamento muito bem. Enfim, nós entramos no banheiro para tomar banho, um de cada vez, os outros ficando de vigia na sala. Era um mártir ficar com uma televisão na nossa frente sem poder usá-la. Ficamos jogando cartas e conversando, principalmente. Quando a Vany (que foi a primeira) foi tomar banho, a gente começou a conversar.

-Cara, a gente vai pegar mais coisas no apê da Vany. Se no meu tinha tanta coisa assim, no dela vai ter muito mais!-Eu disse.

Ivan respondeu:

-É verdade, a gente pode achar mais comida para estocar aqui, assim, sempre que precisarmos, poderemos voltar aqui para mantimentos.- De repente, Ivan arregalou os olhos- Ei! Eu tive uma ideia... Ah, não, é muito ruim. Arriscaria nossas vidas.

Pedro disse, irritado:

-Fala, Ivan!

Ivan começou:

-Bem... É que, se no seu apartamento tem tanta coisa... Nos outros apartamentos pode ter muito mais. A gente devia vasculhar outros apartamentos, não só o seu e o da Vany. Na verdade, a gente devia caçar cada zumbi desse prédio, pra tornar ele completamente seguro pra nós. E quem sabe a gente ache algum outro sobrevivente, ou armas melhores, vamos conseguir estocar comida. Enfim, eu nunca ouvi falar de um zumbi que soubesse pegar elevador ou subir escadas altas. Se a gente eliminasse os do prédio, a chance de algum outro aparecer e efetivamente nos ameaçar seriam bem baixas.

O Pedro sorriu e disse:
-Eu me voluntario pra caçar esses putos.

Eu ergui a mão também:
-A coisa que eu mais quero é destruir o máximo desses malditos enquanto eu estiver por aqui. Ivan pode ficar por aqui com a Vany, assim um cuida do outro e se a gente acabar se ferrando, ainda sobra alguém do grupo.

Um silêncio se fez. Eu tentei não parecer preocupado ao dizer isso, mas era impossível não me preocupar por dentro. Eu poderia estar pulando para a morte. Mas eu tinha feito minha decisão. Mesmo que eu fosse morrer, eu iria lutando, levando o máximo possível deles junto comigo. Esses malditos eram a causa disso tudo. Não eram naturais. Iam contra tudo o que eu acreditava e tudo que fazia sentido pra mim até hoje. Eu tinha ódio deles. Porque eles destruiram a vida de famílias, mataram pessoas inocentes. Porque os seus vírus estavam dentro de nós. Por causa disso tudo, o que eu mais queria era estourar as cabeças deles. Acho que nunca tinha odiado nada tanto assim em toda a minha existência.
Começamos a planejar direito a ação. Ficamos pensando. De dia, poderíamos ver eles e ser vistos com maior facilidade, enquanto de noite, o contrário. Decidimos ir de dia. Não devíamos levar todas as armas, pra que eles pudessem se defender se acontecesse algo. Devíamos combinar uma batida pra que eles soubessem que éramos nós e abrissem a porta pra gente. Enfim, um monte de detalhes que ficaram mais ou menos resolvidos até a Vany terminar o banho e aparecer na sala com uma toalha enrolada no corpo e outra na cabeça, envolvida em nuvens de vapor, dizendo:
-O próximo na fila pode entrar.

Todos correram para lá, mas eu cheguei primeiro e tranquei a porta do banheiro. Entrei no banho e deixei a água quente bater nas minhas costas e no meu rosto. Como era relaxante. Não tinha passado nenhum dia e eu já tinha me esquecido de como era tomar banho. Eu fiquei um tempão enrolando no banho. Me perguntei mentalmente por que os militares não desligaram a água e aí eu lembrei que eles ainda estavam evacuando o bairro hoje, portanto ainda deveria ter água em todo o lugar. Saí do banho, mas não tinha toalha: A Vany tinha levado as duas. Droga. Eu destranquei a porta e chamei a Vany, me escondendo atrás da porta. Ela ainda estava vestindo as duas toalhas, eu só deixei a cabeça pra fora do banheiro e disse:
-Ahm... Toalha?
Ela fez uma cara de "Ah é..." e começou a rir e depois me entregou a toalha que estava usando no cabelo. Eu me sequei, botei uma roupa e saí do banheiro. Passou por mim, correndo, Pedro, indo em direção ao banheiro. Eu senti aquele frescor pós-banho. Podia ter sido o último banho da minha vida. Eu estremeci e perguntei para a Vany:
-Por que você não põe a sua roupa?

Ela reclamou:
-Tá muito suja. E além do mais, toda rasgada.

Eu pensei um pouco e fui pro quarto do meu irmçao. As roupas da minha mãe eram muito pequenas pra Vany, porque a Vany era muito mais alta que a minha mãe, mas meu irmão era maior que todos nós, por isso, apesar das minhas roupas não servirem nela, quem sabe as dele serviriam. Ela teria que se contentar. Eu peguei um casaco mais levinho porque estava meio frio e entreguei pra ela, além de calças, uma camiseta e um cinto. Ela se refugiou no quarto dele. Voltou vestida. Foi engraçado ver roupas tão grandes nela. Ela deu um sorriso enorme e pulou em cima de mim, dizendo:
-Brigada, Guinho. Você é um amour (Ela gostava de colocar "u"s em amor).

E me deu um beijo na bochecha. Eu sorri e perguntei, ficando sério:
-Eles já te disseram da ideia do Ivan?

Ela assentiu. Eu perguntei:
-O que você achou?

Ela disse:
-Tudo bem, desde que vocês dois voltem inteiros. É uma boa ideia.

Nós fomos para a sala e encontramos o Ivan assistindo TV sem som. A gente arregalou os olhos e começamos a dançar e a cantar enquanto abraçávamos o Ivan e ríamos muito.
-Ivan, você é um gênio!
Ivan disse, confuso:
-O que foi? Eu só fiz o óbvio.

A gente continuou assim e o Ivan logo foi tomar banho quando Pedro saiu.
***
Algum tempo depois, após vermos as notícias e descobrirmos que mais um número enorme de pessoas tinham sido infectadas (O nº foi mostrado na tela), resolvemos desanuviar e assistir alguma coisa mais leve, para passar o tempo. Eu servi a todos nós de refrigerante e nós assistimos ao DVD do Harry Potter e a Pedra Filosofal que eu tenho em casa, com legendas. Eu e a Vany éramos friorentos, então passamos o filme embaixo de uma coberta, no sofá grande, enquanto Pedro e Ivan sentavam-se no pufe e na poltrona, respectivamente. Eu senti falta de passar um tempo assim com a Vany, fazia tempo que a gente não fazia esse tipo de coisa que nem eu sei se era de casal ou de amigos. A gente passou o filme todo abraçados debaixo das cobertas, enquanto eu e ela brincávamos um com o outro, nos provocando, cutucando, irritando. A gente precisava aproveitar esses momentos que iriam acabar se tornando mais raros, nós sabíamos. A gente precisava aproveitar esses momentos simples, mas que faziam toda a diferença. A gente precisava aproveitar a vida enquanto a gente ainda a tinha. Enquanto ainda não éramos cadáveres ambulantes, coisa que poderíamos ser amanhã, ou hoje mesmo. Valia mais à pena aproveitar esses momentos do que garantir a segurança. Pelo menos é isso que eu acho.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Capítulo 9- Preparação

A primeira coisa que a gente percebeu ao chegar ao andar nº 13 foi que a porta estava aberta. Droga! Eu tinha esquecido de trancar, na pressa de descer. E agora a porta estava aberta. O Ivan sussurrou atrás de mim:
-Hugo, por que a porta está...

Antes de ele completar a pergunta, eu interrompi, olhando pra ele com um olhar fulminante:
-Por que você acha, Ivan?

Ivan falou:
-Tá, calma, eu só...

Dessa vez foi Pedro que interrompeu, dizendo:
-Cala a boca, Ivan!

Eu ergui o quadro e encostei na porta, que abriu, fazendo barulho. Encostado nela, eu me virei, quadro em punho, para encarar a ante-sala. Ninguém. Havia um espaço entre os dois sofás que poderia facilmente esconder uma pessoa. Eu pulei sobre o pufe e caí em cima do sofá, erguendo o quadro, mas também não havia ninguém lá. Eu ouvi uma risadinha atrás de mim. Respirei fundo. Ivan foi para a cozinha e eu comecei a seguí-lo. Um dos vidros da porta da cozinha estava quebrado, uma mancha de sangue no chão. Isso confirmava nossas suspeitas: Havia pelo menos um indivíduo na minha casa, aquilo não estava assim quando saímos. Porém, é claro, o que quer que houvesse entrado, também poderia já ter saído. Mas não era bom arriscar. Ivan abriu a porta e, nesse instante, vimos um homem, o vizinho do andar de cima, careca, com a boca cheia de sangue; virando-se para nós. No momento em que entramos na cozinha, soubemos que ele era um zumbi. A Vany gritou. Eu olhei para a pequena gaveta que guardava as facas, que ficava poucos centímetros acima do chão, mas que estava atrás do zumbi. A outra porta da cozinha estava aberta. Eu disse pra eles rapidamente:
-Distraiam ele, eu já volto!

E saí correndo, atravessando a ante-sala, a sala, a sala de jantar e entrando, finalmente, na cozinha. Quando eu entrei, eu vi o Ivan jogando a latinha no zumbi, mas a latinha errou e teria me acertado, se eu não houvesse me abaixado para pegar as facas. Eu puxei a gaveta com tanta força que ela caiu. Eu, ao invés de procurar uma faca, percebi como a gaveta era pesada. Eu sorri e virei as facas no chão. Eu levantei e vi o zumbi sendo acertado por uma "latada" na cabeça, vinda de Pedro. Finalmente a latinha amassou. O zumbi deu um passo para trás e, com toda a minha força eu bati na cabeça dele, dizendo:
-Morre de novo, filho da puta!

Eu ouvi um baque surdo e o zumbi caiu para frente, se soltando da gaveta com um som de sucção. Eu chutei ele, enquanto a Vany tapava a própria boca.

***
Depois de Ivan e eu termos carregado o corpo para fora, nós voltamos e começamos a vasculhar os outros cômodos. Felizmente, não havia nenhum outro zumbi na casa. A nossa primeira atitude ao saber disso, foi trancar a porta e colocar dois sofás na frente dela. Quanto à porta dos fundos já estava trancada e empurramos a máquina de secar e a de lavar para a frente dela. Então a gente se sentou na mesa grande, de jantar, de onde dava para mantermos um olho na porta da frente. Eu peguei canetas e papel e fiz uma contagem das malas: 7 malas, incluindo as que eles trouxeram para passar a noite. Nós encheríamos 3 com comida, 2 com acessórios e outras duas com roupas. Armas não seriam seguras de se levar dentro de malas, precisavam estar à disposição. Quanto à comida, nós escolhemos várias coisas, coisas demais, muita variedade, mas pouca quantidade. Percebemos que não iria caber em 3 malas. Então começamos a tirar algumas coisas que não iríamos comer ou que iriam vencer em pouco tempo. No entanto, eu me envergonho ao dizer que as nossas escolhas não foram das mais saudáveis. Além disso, enchemos algumas garrafas com água.
Era basicamente sorte que o Pedro e o Ivan usassem mais ou menos o mesmo tipo de roupa que eu e nós colocamos várias nas duas malas, optando pelas mais escuras, opacas e resistentes. Para a Vany, a gente iria ter mais problemas. Ela era mais ou menos do nosso tamanho também, mas, bem... Como dizer isso...? Digamos que o busto dela atrapalhava um bocado. A gente ia ter que pegar roupas dela. No Ivan, as roupas serviam certinho e no Pedro ficavam um pouco curtas, mas tudo bem.
Acessórios, a gente conseguiu: Remédios (pra dor de garganta, gripe, dor muscular, etc...), mais um kit de primeiros socorros, tesouras (que também são armas, mas vão ser melhor usadas como acessórios), escovas de dente, lençóis, cobertores, 1 lanterna e relógios de pulso.
Agora, a parte mais empolgante. Como armas, conseguimos 3 facas serrilhadas, 1 faca de cortar carne, 1 faca grande, 1 faca para cortar peru (longa), 2 tacos de Bet's, 1 raquete de tênis, 1 estaca de madeira (Uma escultura de lápis gigante feita por mim no maternal. Nunca soube por que não joguei aquilo fora) e 3 cabos de vassoura. Nós dividimos de maneira que quase todos carregássemos o mesmo peso. A gente não ia sair da casa tão cedo, mas quando a gente saísse, era melhor a gente ir preparado. Quanto a hoje à noite, a gente comeu as comidas que iriam vencer rapidamente, enquanto conversávamos e tentávamos arranjar um assunto que não envolvesse as coisas que estavam acontecendo.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Capítulo 8- Uma Longa Subida

Nós entramos na portaria, tudo quieto, escuro. Demos a volta nos dois elevadores e começamos a subir as escadas. Elevadores eram uma péssima opção. Pouco espaço para fugir e para lutar. Se um zumbi entrasse lá, estávamos perdidos. Fomos subindo as escadas lentamente, mais ou menos do mesmo jeito que fazíamos com a rua. Um subia o lance e depois descia e avisava os outros, que ficavam prontos para a ação. Isso tornava a subida muito mais devagar e cansativa, considerando que eu morava no andar nº13. A gente já tinha subido um monte. Era a vez do Pedro de ir verificar primeiro e aí a gente ouviu um barulho diferente e o Pedro voltou rápido, dizendo:
-Tem um zumbi do outro lado do corredor, mas eu acho que ele não me viu.

Eu olhei pra ele e virei pro Ivan:
-Ivan, você fica aqui e protege a Vany. Vany, você fica aqui e cuida do Ivan. Se a gente mandar, vocês correm, não quero que vocês subam sem que a gente deixe, ok? Pedro- Eu fiz uma pausa, respirei fundo e disse- Vamos matar zumbis.

Pedro assentiu com a cabeça e nós subimos. A cada andar, havia um "hall" antes de entrar efetivamente nos apartamentos. As escadas subiam pelos fundos, aonde haviam duas portas, uma pra cada apartamento. Nesse espaço, também ficava o elevador de serviço. Ao lado do elevador, um corredor estreito, com uma porta de cada lado, levava à entrada da frente. Pedro havia visto um zumbi virado de costas pelo corredor. Deduzimos que ele devia estar por lá. Pedro tomou a dianteira e, erguendo a latinha, foi andando. Eu vi ele andar cautelozamente, entrando no corredor. Eu senti o suor brotando na minha pele. Ele foi andando devagar e virando de lado, de costas para a parede, que ficava na saída do corredor. Então tudo ficou em câmera lenta. Eu vi um zumbi indo pra cima dele e ele, num reflexo impressionante, erguendo o pé e dando um pisão no peito do zumbi, que foi lançado para trás. Eu só vi o zumbi de relance, mas deu pra perceber que era uma mulher adulta. Então Pedro, segurando a lata, partiu pra cima da zumbi e saiu da minha visão. Eu saí do corredor e vi Pedro acertando a lata na testa da zumbi, de cima pra baixo. Ela caiu sentada, batendo na parede e derrubando um quadro que ficava pendurado lá. Eu não podia fazer nada para ajudar o Pedro de onde eu estava, porque ele estava na minha frente, então eu pulei oara o lado dele e joguei a latinha com toda a força, mirando a cabeça da desmorta. Eu errei. Merda. Eu queria pegar o quadro, mas estava logo embaixo da zumbi. Pedro acertou outro golpe na testa dela com a lata e eu, me sentindo inútil, só assisti, desesperado. Pedro começou a desferir golpes seguidos na testa dela, sempre cuidando para nem passar perto da boca. E o rosto dela começou a sangrar. Pedro aumentou a força continuando a acertar a cabeça da zumbi, que parou de se mexer. Só pra garantir, ele acertou mais uma vez. A latinha nem tinha amassado, impressionante. Ele só tinha acertado ela com a parte de baixo, que é muito resistente. Eu me abaixei e peguei o quadro. Foda-se a minha latinha. Agora eu tinha uma moldura e vidro. Eu me cortei e logo começou a sair sangue do meu dedo. Eu botei o dedo na boca e o Pedro foi chamar os outros, enquanto eu me dirigia, xingando, para as escadas.
Eu já tinha caído de cara no asfalto e quebrado os dois braços ao mesmo tempo (Muito antes da invasão), mas era impressionante como aquele cortezinho no dedo doeu. Eu xinguei a mim mesmo de fresco e tentei ignorar a dor. Continuamos a subir. O dedo não parava de sangrar e eu comecei a ficar extremamente incomodado. Percebi que tinha entrado um pedaço de vidro no meu dedo e xinguei alto. Parei sem falar nada para os outros e sentei, tirando uma agulha de dentro do kit de primeiros socorros. Com cuidado, enfiei a agulha no corte, o que doeu pra caramba. Mexi a agulha lá dentro e doeu mais ainda. Senti meus olhos lacrimejarem e eu comecei a gemer. Eu tentei tirar o vidro lá de dentro, mas ele simplesmente não queria sair. Eu comecei a me desesperar e percebi que só ia doer mais se eu continuasse. De raiva, comecei a chorar, agora nem me importando mais com a dor. Eu me sentia inútil e sentia agonia e desespero. E aí eu acho que os outros perceberam que eu tinha parado e voltaram. Será que nem pra eles eu tinha importância? Eu estava sentado, chorando, mexendo com a agulha freneticamente no corte, o que só abriu ele mais e minha mão começou a pingar sangue. O Ivan gritou:
-Hugo, o que você tá fazendo?!

A Vany correu e se abaixou do meu lado e segurou minhas mãos. Eu só chorava. Pedro fez uma cara de confuso. Há um minuto atrás, eu estava bem. A Vany tirou a agulha da minha mão e se sentou do meu lado e o Pedro puxou o Ivan no canto e eu ouvi ele perguntar:
-O que aconteceu?

Deviam estar pensando que eu estava atrasando eles. Toda essa merda acontecendo e eu atrasando eles. Era isso que eu era pra eles. Atraso. A Vany estava falando alguma coisa e eu nem ouvi. O Pedro e o Ivan foram fazer guarda. No meio da escada. A Vany me abraçou e eu encostei a cabeça no ombro dela. Ela me perguntou:
-O que foi?

Eu comecei a falar de repente, metralhando palavras, falando tudo rápido demais e chorando ao mesmo tempo. Expliquei pra ela o que tinha acontecido. Que desde que entramos no prédio eu tinha sido inútil. Ela me tapou a boca com a mão e brigou comigo:
-Cala a boca! Cara, você não é inútil, se toca! Só porque você não conseguiu fazer nada não significa que você é inútil. Você tentou, poxa! Você tá colocando muita responsabilidade sobre si mesmo, tentando ser um líder! Nós não queremos um líder. Nós queremos você. Só você. Mesmo que você não fizesse nada, a sua presença ia ser o suficiente, tenho certeza, pra todos nós. São as pequenas coisas que você faz, como alegrar todo mundo, parecer sempre seguro de si mesmo e ser tão compreensivo.- Ela sorria, os olhos aguados- Você tem sido ótimo pra todo mundo, apesar dos erros Guinho. E não precisamos mais do que isso.

Aí ela pegou a agulha e com calma, tirou o vidro do meu dedo num movimento só. Eu gemi e nós começamos a rir. Ela levantou e estendeu a mão pra mim.
-Vamos, ainda temos que chegar na sua casa.
Eu me levantei sem ter vergonha de me apoiar na mão dela. Ela sorriu e limpou meu rosto com os dedos. Eu me senti bem novamente. Eu sabia que meus amigos estariam lá por mim quando eu precisasse, mesmo o Pedro, que parecia tão insensível, depois se mostrou preocupado comigo. E eu teria que estar lá por eles quando todo o stress de tudo que a gente tá passando chegasse no limite. Mas tudo bem. Eu faria isso quando chegasse a hora.

terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Capítulo 7- Voltando para Casa

A noite caiu, mas a gente ficou com medo de acender as luzes da farmácia, porque poderia atrair alguém ou algo. A cidade parecia deserta. A gente foi andando sorrateiramente ladeando os arbustos, muros, se escondendo atrás de postes, ou se agachando. Acho que nunca tinha sujado tanto minha roupa. Quando chegássemos lá, ela estaria rasgada, suja, fedida e nojenta. Também, foda-se. Não vou ficar me preocupando com roupas. Melhor a roupa chegar lá assim do que eu. Enfim, nós fizemos um esquema assim: Uma pessoa ia na frente para olhar a cada esquina, avisando se era seguro, enquanto os outros três esperavam e olhavam tanto a frente quanto atrás. Não queríamos ser pegos de surpresa. Nem pelos zumbis e nem pela patrulha, que já devia estar começando. A gente se atrasou na farmácia tentando decidir o que levar de lá. Cada um levava na mão um kit de primeiros socorros, o que nunca é demais. As melhores armas que tínhamos lá eram as garrafinhas de vidro, mas elas provavelmente iam quebrar e iriam fazer muito barulho, se encostassem em algo. Então optamos por latinhas, que eram a segunda melhor opção. Nada a ver, mas imagine uma menina morena vestida com um topzinho rosa, uma saia escura, botas; um cara alto, magro, de cabelo comprido e loiro, vestido numa camisa vermelha e uma calça cinza; um cara magro, com cabelo preto espetado, com uma jaqueta preta, uma camisa cinza e uma calça jeans; um cara moreno, de cabelo enrolado curto, usando uma camisa preta com o capacete do Darth Vader e uma calça jeans; todos eles se arrastando no chão, segurando malinhas brancas numa mão e latinhas de refrigerante na outra, todos com cara séria. Eu tive que me segurar pra não rir ao pensar nisso. Foi aí que eu vi: a Vany estava se arrastando na minha frente e a gente tava quase chegando num lixo, aonde daria pra nos escondermos enquanto Ivan corria na frente pra checar se era seguro. No meio da perna da Vany, andando despreocupada, estava uma barata. Eu me desesperei, estendi a mão e toquei na perna dela. Ela parou e olhou pra trás, viu a barata e berrou. Eu tirei a barata da perna dela com um tapa, a barata saiu voando noite adentro. O berro da Vany ainda ecoava. Maldita barata. Nós quatro dos escondemos apertados atrás do lixo, daquelas quadradas, grandes e verdes. Uma formiga subiu na minha perna, fazendo cócegas enquanto andava e eu a esmaguei. Os insetos estavam contra nós também, era isso? O silêncio reinou por uns minutos e aí o Ivan resmungou:


-Por que você gritou?!





Eu olhei pra Vany e a Vany olhou pra mim. E aí a gente não segurou, começamos a rir, o mais baixo possível. Rimos muito e logo o Pedro e o Ivan começaram a rir junto sem nem saber o motivo. A gente riu baixo, e nos fez bem, porque fazia tempo que a gente não ria, mas isso atraiu a atenção de alguma coisa. A gente ouviu um carro, provavelmente grande, militar, dobrando a esquina e aí a gente se grudou atrás do lixão. Todas as risadas pararam abruptamente. A gente viu os faróis do carro passando e ouviu alguém engatilhar uma arma e perguntar:

-Alô? Tem alguém aí?



O silêncio da noite respondeu. Nada. Então uma voz diferente, feminina disse:

-Vamos embora, não tem nada aqui. A gente tem que voltar e terminar de evacuar nossas ruas. E se ouvirmos mais alguma coisa fora do nosso local de incumbência, ignore!



Ouvimos o carro partir. Meu coração batia forte no peito e eu suava muito. Nós ficamos grudados lá ainda uns minutos depois do carro ter ido embora. Aí a gente levantou, deu uma olhada em volta e voltamos à nossa cansativa jornada. Ninguém comentou nada porque ninguém queria fazer mais barulho.A gente foi andando pela rua, cuidadosamente, nos escondendo sempre que dava. Pouco tempo depois, chegamos ao meu prédio.



***


A gente parou na entrada do prédio. Tudo estava muito quieto. A gente ia ter que pular a grade. Jogamos os kits de primeiros socorros por cima da grade e ficamos em dúvida do que fazer com as latinhas, que por fim, rolamos por baixo da grade. Como eu conseguia pular sozinho, eu fui fazendo pezinho pra todo mundo e fiquei por último. Pelo menos esse era o plano. A Vany se recusou a receber pezinho, porque ela tava de saia. Ela pediu pra todo mundo virar pro outro lado e o Pedro disse, com um sorriso:

-Não.


Ela se estressou e eu e o Ivan começamos a rir, enquanto o Pedro fazia uma voz fininha e dizia:

-Não quero.


A Vany olhou nos olhos dele, pela grade, e disse:

-Vira logo, eu vou ter que subir sozinha e não quero ninguém olhando!


O Pedro cruzou os braços numa pose infantil e disse, com a mesma voz zombeteira:

-Não.


A Vany falou:

-Ah, Pedrusca....


Pedro sorriu. Iavn ria e tossia, como ele sempre faz quando ri. Eu só ria. A Vany virou pra mim e fez beicinho, se inclinando e colocando a mão no meu ombro:

-Guinho...-Era assim que ela me chamava- Faz o Pedro parar...


Eu ri, afastando a mão dela e dizendo:
-Eu não, resolvam vocês.
O Pedro se mostrava irredutível e todo mundo, no fundo no fundo, estava gostando, até a Vany. Mas ele simplesmente não parava. Eu falei:
-OK, Pedro agora chega, vira pra trás, vira. Na moral.
Pedro reclamou:
-Não, cara.
Ivan falou:
-Pedro, vira pra trás.
Pedro disse:
-Cala a boca, Ivan.
E aí virou pro lado, reclamando. A Vany subiu e eu olhei pro outro lado, tentando não me sentir desconfortável naquela situação. Ela não conseguiu subir. Ela reclamou e veio de novo pra cima de mim:
-Guinho...
Eu respondi:
-Eu prometo não olhar.
Ela ficou com um sorriso encabulado, enquanto o rosto dela ficava vermelho rapidamente. Eu me abaixei e entrelacei os dedos, olhando para o chão. Ela pôs o pé em cima da minha mão e eu perguntei:
-Pronta?
Ela assentiu, dizendo:
-A-hã...
Eu levantei a mão e continuei olhando pro chão. Eu fiquei olhando pro chão e ela subiu, passando por cima da grade e caindo do outro lado. Então ela disse, com uma voz animada:
-Já podem olhar!
Eu tirei os olhos do chão e comecei a escalar. A eu cheguei até o topo, passei a perna para o outro lado e disse:
-Vamos.
Aí a Vany pulou em cima de mim, passou os braçoes por trás do meu pescoço e me deu um beijo na bochecha.
-Obrigado- Disse ela.
Eu disse:
-Nada...

E começamos a subir os degraus até a portaria. Foi aí que eu me toquei. "A guarita".Eu voltei rapidamente e procurei na guarita por algum item últil. E eu achei o controle remoto do portão. Eu fiquei parado boquiaberto com aquilo na mão, enquanto a gente voltou a rir. Depois a gente foi andando pra dentro do prédio, os quatro, lado a lado. O fato é que todas aquelas risadas tinham levantado o nosso astral. Fazia muito tempo que a gente só chorava e agora a gente tinha percebido que, apesar de estarmos naquela situação, a vida ainda era a vida. Muita coisa tinha mudado, mas muita coisa continuava igual. E é assim que são as coisas.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Capítulo 6- Conflitos

Eu me encolhi. O algodão embebido em álcool nem tinha me tocado ainda e eu me encolhi. Senti vergonha. A Vany perguntou:
-Tudo bem?

Eu assenti com a cabeça. Aí ela perguntou:
-Posso?
Eu assenti de novo. Com a queda no asfalto eu tinha feito um cortezinho acima da sobrancelha e um corte grande na testa. Precisei levar pontos, o que foi o momento mais agonizante que eu já passei em toda minha vida. Foi Pedro quem fez. Ele era o único que tinha sangue frio o suficiente. A gente ferveu água e esterelizou a agulha e o fio. Eu sentia a agulha entrando na minha pele e eu não conseguia nem mesmo ver o que estava acontecendo. O tempo todo eu fiquei lembrando do zumbi no apartamento, com uma agulha de tricô enfiada no pescoço. Depois de ver o machucado maior, a gente foi dar uma olhada no menor. A Vany estava inclinada para frente, eu estava sentado na cadeira olhando para o alto e ela começou a passar o algodão em meu rosto. Ardeu pra caramba. A ideia de ir para uma farmácia fora do Ivan. E fora genial. Tinha uma farmácia perto de onde a gente tinha parado. A Vany perguntou "E agora?" e o Ivan, após alguns segundos, apontou para a farmácia vazia. Mas ela estava trancada. Como não havia ninguém a vista, eu joguei um tijolo na porta de vidro e um alarme soou alto. Ivan logo encontrou e desligou a energia, o que também desligou o alarme. E cada um foi cuidar dos seus machucados, menos eu, que precisava de ajuda.
Foi quando a Vany terminou de limpar meu machucado que eu percebi como estava com fome. Não havíamos comido nada desde que acordamos. Então todos procuramos bebidas, comidas e outras coisas. Sentamos atrás do balcão da farmácia e começamos a comer. Pedro, como sempre, tomava uma garafinha de água mineral e comia um pacote de Doritos. Eu bebi uma lata de Ice Tea da pêssego e comi algumas barras de cereal, que dividi com a Vany. Ivan escolheu uma Coca e chocolates. Então a gente começou a conversar.
-Vocês percebem que a gente tá roubando tudo isso, né?- Ivan comentou.
A Vany deu uma mordida na minha barra de cereal, pensativa: - E se amanhã tudo estiver resolvido?
Pedro riu. Ele disse: -Ninguém vai conseguir provar que fomos nós, é só a gente queimar as fitas de segurança. Mas eu duvido que tudo isso se resolva de uma hora pra outra.
Vany replicou:
-Ué, mas começou de uma hora pra outra.
Ela tinha razão. Fazia até sentido. Mas no fundo, a gente sabia que não ia ser tão fácil resolver as coisas.
-E depois disso? O que fazemos?- Disse Ivan, entre um gole e outro de sua Coca.
-Cara, depois disso... A gente vai ter que começar a tomar mais cuidado. -Eu respondi- Esse vírus acabou de estourar, mas logo logo vão ter milhares de zumbis andando por aí. Essa cidade é enorme...

Todo mundo parou de comer quando eu mencionei isso. Será que eu tinha sido rápido demais? Será que eles já não esperavam isso? Mas daí eu lembrei. Nós estávamos contaminados. Como ia ser? Quanto tempo ia demorar pra gente morrer? Ninguém além de mim estava se sentindo mal. Eu estava com fortes dores de cabeça e sensação de tontura, mas acho que isso acontece depois de uma pancada porte assim. Só podíamos esperar. O silêncio fúnebre foi quebrado por Pedro, que comentou:
-A gente vai precisar de muitas coisas pra sobreviver por aqui. Afinal, a gente não vai conseguir ajuda dos militares enquanto estivermos infectados, vírus ativos ou não. A gente vai precisar de um lugar pra passar a noite. De trocas de roupa. De mantimentos. De armas pra nos defender.

Todos nós ficamos quietos. Eu pensei um pouco e disse:
-Nós vamos voltar lá em casa. E vamos conseguir tudo isso.

Todos eles ficaram estarrecidos, eu continuei:
-É óbvio, quer dizer... Eles vão procurar lá? Eles já estiveram lá, né? A gente só tem que pensar de uma maneira de passar por eles despercebidos. Lá tem facas, cadeiras, raquetes de tênis, panelas, um cajado, estacas de madeira. Pena que a gente vendeu a lança.

Ivan se surpreendeu:
-Uma lança?
Eu ri e continuei:
-É, meu pai tinha uma lança indígena real, feita de madeira maciça, mas a gente vendeu. Não servia pra nada. Bom, lá estão suas malas e temos muitas mais. Poderemos encher algumas de mantimentos, outras de roupa. Outras de outras utilidades, como lanternas, cordas, kit de primeiros socorros.

Todos eles foram ficando empolgados. A gente começou a decidir os detalhes do plano para invadir minha própria casa.

***
Algum tempo depois, a gente resolveu ligar pros nossos pais. Achamos que seria o mais sensato a se fazer. Fora que, alguns estavam extremamente preocupados ou com saudades. Enquanto cada um ligava pros seus pais e explicava para eles a situação, a gente via a fortaleza que a pessoas era desmoronar. Todos choramos, ao perceber que provavelmente iríamos passar um longo tempo sem ver nossos pais. A gente sabia que o bairro inteiro tinha sido isolado. Não tinha como a gente ver eles agora. Após isso, sentamos todos no chão, na seção de cosméticos, de onde tínhamos uma boa vista da porta ao mesmo tempo que ficávamos relativamente escondidos; enquanto conversávamos. De repente, eu resolvi perguntar.
-Qual foi a última coisa que vocês disseram para seus pais? Tipo... Quando vocês tavam com eles.
Pedro tomou a dianteira e começou a falar:
-Eu disse "tchau pai, até mais".
Só depois que as palavras saíram da boca dele que ele percebeu o significado delas. E aquilo afetou ele. Pedro era bastante insensível, ou não gostava de demonstrar os sentimentos, não sei. Mas aquilo afetou a todos nós. E ele se levantou, deu uma porrada na estante de cosméticos que fez vários shampoos caírem, e foi embora. Ficou um silêncio grande enquanto a gente ouvia ele jogando objetos pela loja, num acesso de raiva, frustração e stress. E ninguém culpava ele. Todos nós, no fundo no fundo, queríamos estar aconchegados nos abraços de nossospais e mães, queríamos estar fora daquela situação. Apesar de, pelo lado bom, ser muito massa e algo que a gente sempre sonhou (Matar zumbis!), por outro lado, era real. E a gente não podia parar quando quisesse e nem arriscar a vida tanto assim. A gente não podia pegar um taco de beisebol e sair por aí esmagando crânios como a gente sempre quis. Não, isso era a vida, a gente estava sentindo emoções que nunca imaginamos sentir tão intensamente. E era normal que a gente se surpreendesse uns com os outros ou consigo mesmos. Por isso ninguém reclamou enquanto Pedro destruía a loja. Cada um, dentro de si, se via fazendo a mesma coisa. O Pedro finalmente percebeu que aquilo não era um jogo, que ele podia acabar morrendo ali. Ele finalmente sentiu a mesma raiva que eu dos zumbis. Malditos zumbis. Dava vontade de destroçar cada um deles. Ele se sentou novamente na nossa frente e, com os olhos vermelhos e as mãos tremendo ele disse, com uma voz mais alta do que a necessária:
-Escuta... Eu vou lá fora, por que se eu ficar aqui vocês vão se machucar.
Eu me preocupei:
-Mas e se acontecer alguma coisa?
Ele se levantou e disse, andando para a saída:
-Ai de quem aparecer no meu caminho, zumbi ou humano! Eu volto mais tarde.
***
Acho que passou um tempo até que Pedro voltasse. A gente ficou matando o tempo e foi engraçado como ninguém passou por ali o dia inteiro. Conversamos, tentando nos manter fora do assunto mais assustador, andamos pela loja, jogamos joguinhos como detetive, enquanto ficávamos sempre de olho do lado de fora. Tentamos nos manter calmos e houve uma seção de terapia quando a Vany começou a falar sobre a avó dela.
-Eu vi que ela tinha sido mordida, por isso saí o mais rápido possível de perto do corpo. Eu sei que pode ser maluquice, mas todo mundo já ouviu falar de zumbis...- Ela fez uma pausa enquanto mexia nos cadarços de seu Allstar azulado- E eu liguei uma coisa a outra. Sabia que, se ela voltasse, eu não conseguiria mais fazer nada. Nada. Nem levantar, nunca mais.
Ela começou a chorar e eu abracei ela, enquanto ela despejava as lágrimas sobre meu ombro. Ivan ouvia a tudo atentamente com uma cara de inconformado. Ele achava tudo isso muito injusto. A seção de terapia demorou mais meia hora depois disso, mais ou menos. E aí, quando eram lá pelas 18:30 (Horário de verão), o Pedro voltou. Parecia muito mais calmo, mas ainda assim inconformado. Ele se recusou a falar sobre o que aconteceu na caminhada, menos uma coisa.
-Pelo que eu vi- Ele contou- Os militares estão apavorados. Eu aproveitei pra dar uma olhada neles e eles estavam completamente paranóicos. Eles já evacuaram o prédio do jeito deles, mas ninguém subiu e se recusaram a entrar em qualquer apartamento onde pessoas infectadas estiveram. Então seu apartamento vai continuar intacto.
Nós perguntamos pra ele como ele sabia disso tudo e ele disse que tinha ouvido dos militares. A gente perguntou como e ele não quis dizer, mas disse que eles iriam começar as patrulhas hoje à noite, para evacuar quase o bairro todo. E a gente deveria estar no prédio quando as patrulhas começassem. A Vany disse:
-Não se preocupe. A gente vai invadir hoje à noite.

Capítulo 5- A Fuga

Eu não sei porque, mas a ideia surgiu de repente na minha cabeça. Era tão simples e ridícula. Eu acho que eu vi as pessoas olhando pelas janelas e sabia que estaria seguro enquanto elas pudessem me ver. Se matassem um civil na frente delas, ficaria muito mal na foto pra eles, ninguém mais iria cooperar. Como eu sou ator, isso ajudou pra caramba. Eu simplesmente caí no chão. Não foi fácil, deixar o asfalto bater no rosto de propósito, mas era isso ou a morte certa. Senti o sangue que escorria rápido do meu rosto. Logo os militares se afastaram, não queriam entrar em contato com o sangue. Eu ouvi umas expressões de surpresa dos civis ao redor:
"Oh! Coitadinho!"

Uma frase que eu já tinha lido em algum lugar passou pela minha cabeça naquele momento e eu quase sorri. "A força pode ganhar a luta, mas é o estilo que ganha a multidão". E era a multidão que eu queria ganhar. Alguns ficaram com medo, mas a maioria das pessoas ficaram penalizadas. Estava funcionando. Nenhum militar se atreveu a ir me ajudar, porque havia muio sangue à minha volta. A cabeça é uma das partes mais irrigadas do corpo, provavelmente eu tinha só um cortezinho, mas mesmo uma incisão pequena pode sangrar bastante. Eu lembro de uma vez no meu colégio que um dos meus colegas levantou-se bem embaixo de um extintor de incêndio e bateu a cabeça. Ele pôs a mão na cabeça e quando a tirou, ela estava quase que inteiramente vermelha. Logo todo seu rosto estava coberto de sangue enquanto a gente corria pra enfermaria. Depois de limpo, nós pudemos ver o corte. Tinha mais ou menos o tamanho de uma unha, em comprimento. A anatomia humana é uma coisa interessante.

Eu comecei a me debater, de propósito. Queria aumentar o drama. Claro que eu não tinha avisado meus amigos do plano e eles provavelmente ficaram apavorados. De repente, um militar em um traje de contenção me segurou pelo pescoço e me levantou, meio que correndo, me segurando o pescoço, para a ruazinha na parte detrás dos prédios. "Droga" eu pensei "Eu me debatendo deve ter feito eles pensarem que eu estava me transformando". Se os civis vissem um zumbi, seria o fim da calmaria e da cooperação. Seria o caos. Me levaram para trás para me executar prontamente. Outro soldado foi seguindo a gente de longe, com uma arma semi-automática preparada. Esse que tava me carregando tinha só um revólver. Chegamos ao fim da rua e viramos a esquina e finalmente estávamos fora da vista dos civis. Eles me jogaram no chão quando, eu não entendi porque, a Vany começou a gritar. Ela não tava gritando de medo, ela só tava gritando. Muito, muito alto. Eu estava caído no chão, virado pro lado de onde a gente veio e não conseguia ver ninguém, mas ouvi um barulho de tapa e aí a Vany ficou quieta. Eu comecei a levantar, dor de cabeça muito alta. O militar estava virado para nós, de costas para o outro lado da rua, a arma levantada. O que estava na roupa de isolamento estava ao lado dele, com a pistola apontada para nós. E extremamente perto, por trás deles, um zumbi se arrastava, definitivamente atraído para o beco pelos gritos da Vany. Eles se assustaram quando eu levantei, achando que eu tinha me transformado, mas eu comecei a falar
-Ai, que dor...

Foi aí que eles perceberam que eu tava normal. Mesmo assim eles tinham que nos matar. Eu comecei a falar, tentando ganhar tempo.
-Que merda, desculpa, caras, eu tenho pressão baixa e as coisas só pioram quando eu fico nervoso... É meio psicológico- Eu percebi que o cara na roupa de contenção não era o mesmo que tinha passado o scanner na gente. O outro soldado era pouco mais velho que nós. Devia ter 18 anos. Parecia muito nervoso. Achei que quem sabe eles fossem comprar minha história- Então, cadê as ambulâncias?

Ivan logo se juntou:
-É, cadê as ambulâncias? Cadê o tratamento? A gente vai morrer?

Vany começou a chorar:
-Por que vocês me bateram? Eu estou confusa. Vocês prometeram que a gente ia ficar bem.

O cara da contenção disse:
-Botem as mãos na parede. Eu não quero ninguém olhando pra trás, aconteça o que acontecer!

Foi aí, quando a gente ia se virar de costas, que aconteceu. O zumbi tinha chegado perto o suficiente e escolheu seu alvo: O soldado novo, inexperiente, que definitivamente devia parecer mais apetitoso do que aquela forma humanóide e amarela. O zumbi mordeu o pescoço do soldado, arrancando um pedaço e ele começou a sangrar muito. O outro virou e deu um tiro no zumbi, que continuou vindo pra cima dele. Então ele mirou na cabeça e um monte de sangue jorrou na parede. Aquele zumbi parecia um mendigo, barbudo, com roupas rotas. Ele caiu no chão e o outro soldado começou a agonizar. O soldado mais experiente apontou para a cabeça do soldado mais novo e disse:
-Nada pessoal, amigo. Ordens são ordens.

O outro soldado parecia muito nervoso. Suava, chorava, sangrava. Murmurava o tempo todo coisas ininteligíveis. Então ele fez uma burrice. Algo que eu nunca esperava que um soldado fizesse. Soldados, para mim, eram seres sem sentimento, que eram treinados para cumprir ordens. Provavelmente era preconceito da minha parte. Esse soldado lutou pela vida até o último momento. Ele disse:
-Eu não quero morrer... Eu não quero morrer...

O mais velho disse:
-Calma. Logo logo vai acabar.

O mais novo meteu a mão na arma dele e a levantou com uma mão, gritando:
-Eu não quero morrer!

Encheu o outro surpreso soldado de tiros e depois jogou a arma longe, xingando. Vany começou a chorar enquanto o soldado começou a reclamar:
-Eu nunca quis essa vida... Maldito serviço obrigatório...

Ele estendeu a mão, desesperado:
-Me ajudem...

Eu virei o rosto e comecei a correr para o fim da rua. Não queria pensar nele. Não queria pensar na família dele. Não queria deixar ele para morrer, mas nós tínhamos que fazer isso. Pedro logo puxou a Vany, que foi a mais sensibilizada pelo soldado agonizante. Ivan veio atrás. Logo os outros oficiais estariam ali, seja pelos gritos, seja pela ausência dos dois soldados. Não interessava. Nós corremos pela ruazinha, desabaladamente, corremos o mais rápido que pudíamos para estarmos o mais longe possível dali. Nossa maior preocupação era com os militares, não nos preocupamos em checar por zumbis, mas também não precisava. Por sorte, não encontramos nenhum. Paramos no meio da rua, não haviam carros circulando. Ofegando, as mãos no joelho, nós ficamos quietos por vários minutos. Eu lembrei de que estávamos contaminados. Merda. Esperava que fosse a versão não ativa do vírus. Não podíamos ter sobrevivido tudo isso só pra morrer de repente. Todos nós começamos a sentir o peso de termos deixado o soldado para morrer. Eu senti as lágrimas queimando os meus olhos. Aquele era um ser humano, porra! Ele tinha tanto direito de sobreviver quanto nós. Ele tinha família, sentimentos, gostos, medos, sonhos, desejos. E nós deixamos ele para trás como se fosse carga inútil. "Não," eu pensei "Nós somos seres humanos também. Somos seres naturais. E na natureza, é sobrevivência. Pura sobrevivência. Não existe maldade ou bondade na natureza. Isso são conceitos artificiais e humanos. Nós estamos de volta aos primórdios. Aqui não são as regras humanas que mandam. Nós vamos ter que lutar para sobreviver". Eu me acalmei um pouco, mas percebi que os outros ainda se culpavam um pouco. Pedro, no entanto, estava impassível. Ele viu a gente chorando e então disse:
-Não fomos nós que matamos ele, a gente só não ajudou ele. Mas não tinha o que fazer, acordem! Mesmo que a gente pudesse parar o sangramento, ele estava com o vírus agora, com certeza! Em pouco tempo, iria morrer e nos atacar. Quem matou ele foram os malditos zumbis. A culpa disso tudo é deles, não nossa.

A gente foi se acalmando. Claro que a gente não estava 100%, mas aquilo ajudou pra caramba. Enquanto a gente terminava de recuperar o fôlego, a Vany perguntou:
-E agora? O que a gente faz?

Eu não sabia o que fazer. Não tinha nenhum adulto para nos ajudar. Não tinha ninguém para noz dizer que tudo ia passar e nos proteger. Não tinha ninguém pra responder nossas dúvidas. Não tinha ninguém. Ninguém além de nós, quatro adolescentes comuns: O nerd, o bonitão, a rebelde e o artista. Comuns. E sozinhos. Não sabia o que fazer, não sabia sequer por onde começar. Não sabia como iríamos sobreviver. Não sabia nada. Não tínhamos armas, comida, ou lugar pra ficar. Não tínhamos o mapa da cidade e nem sabíamos pra onde ir. Não tínhamos certeza de que tipo de vírus etava dentro do nosso organismo e nem se a gente podia confiar em alguém. Nós estávamos à nossa própria mercê e sem noção do que fazer. Foi aí que eu me perguntei "E agora?"

domingo, 13 de dezembro de 2009

Capítulo 4- Armadilha

Algumas vezes a vida não é como nos filmes. Na maioria das vezes, na verdade.
Por isso, após essa minha exclusão ao resto do mundo, quando eu voltei para a sala, eu não encontrei a Vany segurando a avó, que falava para ela alguma coisa reconfortante enquanto morria. Quando eu cheguei lá, ela já estava morta. Eu não sei nem se deu tempo pra Vany ver a avó viva. Ivan a consolava. Pedro estava encostado na parede, visivelmente perturbado. Eu sei que ele preferia ficar sozinho, quando se chateava, portanto eu fui falar com a Vany.
-Como você tá, Vâ?

Ela não respondeu. Ivan olhou para mim. Eu comecei de novo.
-Escute, eu sei que não é uma boa hora. Mas nós temos que voltar pro meu apartamento. Eles logo vão chamar a gente e...

Vany levantou e foi embora. Eu olhei para Ivan com uma expressão de "Será que eu falei coisa errada?" e depois levantei. Pedro já estava saindo também. Eu e Ivan deixamos o quarto maldito. Eu estranhei a Vany não querer ficar com o corpo da avó, mas não disse nada. Pedro tentava ouvir o que os militares estavam falando. Ele disse que eles estavam um apartamento abaixo do meu e que era melhor a gente se apressar. Continuamos a descida. Vany parecia mais calma do que eu esperava. Chegamos ao meu andar e entramos no meu apartamento. Eu parei de me preocupar com a Vany e voltei a me preocupar com os zumbis. Eu não sabia ainda o que tinha acontecido, que doença era aquela, mas agora eu sabia porque os militares haviam trazido armas. Mas devia haver uma cura. Eles disseram que os infectados seriam encaminhados para tratamento. Quem sabe houvesse uma cura. É engraçado como, nos piores momentos, a gente se agarra às mais bobas esperanças. Cura, pfffff. Lembrando agora, parecia bem infantil eu esperar por uma cura. Então, pelo alto falante, o militar disse:
-Andar número 13!

Nós nos entreolhamos. Levantamos e fomos para o elevador. A gente esperou o elevador subir e entramos nele. Todo esse tempo, Ivan tinha gastado pensando. Graças a Deus que ele ficou pensando. Foi de repente que ele disse:
-Por que os militares não têm médicos?
-O quê?- Pedro perguntou.
-Cadê os médicos? Os militares disseram que iam dar assistência pra gente, caso estivéssemos infectados, mas não tem médicos lá embaixo.

Finalmente ele tinha descoberto o que estava me incomodando nos militares. Eu tinha descoberto outra coisa pouco tempo atrás, mas antes não fazia sentido sozinha. Agora fazia sentido. O raciocínio foi rápido, quando você pensa milhares de coisas em um segundo. Com força, apertei o botão de parada de emergência e disse:
-Uma pergunta ainda mais importante...- Eu fiz uma pausa, verificando mentalmente se eu tinha REALMENTE visto o que eu achava que tinha visto. Confirmei a suspeita e continuei- Por que as armas deles têm silenciadores?

Ninguém pareceu entender. Eu falei:
-Cara, pensa! Se eles sabiam que tinha o perigo de zumbis, era tudo bem eles trazerem armas, mas o que os silenciadores mudam, se eles iam ficar lá embaixo? Pra não deixar quem estivesse no prédio ouvir tiros e entrar em pânico? Também. Mas principalmente, pra não deixar quem estiver lá embaixo ouvir.

Um momento de breve silêncio tomou o elevador. Todos pareciam confusos. Vany falou pela primeira vez desde que a avó dela morreu:
-Como assim Hugo?

Eu podia imaginar eles como aluninhos, ansiosos para que o professor lhes dissesse a coisa que ia mudar a vida deles, que lhes iluminasse com seu conhecimento. Eu sorri, mas não havia nada de engraçado no que eu ia dizer.
-Por que eles levam as pessoas para o outro lado do prédio? O que eles ganham com isso? A ilusão de que elas estão sendo levadas para as ambulâncias. Mas as ambulâncias não deviam estar aqui na frente? Não seria muito mais seguro estarem aqui junto com os militares? Não, não existem ambulâncias. Se a pessoa é infectada, eles a levam lá para trás e a executam. A sangue frio. sem ela nem saber o que está acontecendo.

Eles começaram a fazer o racicínio mentalmente. O peso das minhas palavras foi atingindo-os e eles foram ficando revoltados. Vany socou a parede do elevador e gritou:
-Porcos malditos!

-É a desculpa perfeita- Eu disse- Um vírus desconhecido. Quem é que vai suspeitar quando eles disserem que 'eles tentaram de tudo, mas ainda não conseguiram uma cura e, infelizmente, fulano morreu'?

Ivan disse:
-Temos que fazer alguma coisa

Eu comecei a raciocinar. Já tinha pelo menos um zumbi no prédio. Quanto tempo demorava para a transformação? Eu não sabia. Eles já deviam estar suspeitando da nossa demora e deviam estar invadindo o apartamento em pouco tempo, se não descobrissem que o elevador tinha parado. Tínhamos que bolar um plano de fuga. Uma maneira de escapar dos militares. Nem fudendo que a gente ia se unir com eles. Confiar neles. Eu apertei o botão de parada de emergência novamente, e o elevador voltou a andar. Não sabia o que fazer, mas ficar parado lá não dava. As portas se abriram e logo dois soldados parrudos nos puxaram para o lado de fora. Nós começamos a andar em direção à rua e logo um soldado num daqueles trajes de contenção começou a scannear a gente com o lazer, enquanto dizia um texto que provavelmente repitiu pra cada uma das famílias antes de nós.
-O vírus é desconhecido e letal. temos que fazer um tratamento rápido se quisermos ter chance de recuperação, porém a cura ainda não foi descoberta. Todos precisam ser verificados, porque, mesmo aqueles que não demonstram sintomas podem ser portadores do vírus. Também não pensem que são imunes, os portadores têm uma mutação do vírus feita para ser silenciosa, que, no caso, não é letal. Mas se eles pegarem o vírus outra vez, pode ser a versão ativa e aí eles vão demonstrar sintomas como todo mundo.

Enquanto ele dizia isso, ia escaneando a gente. Então ele esperou um momento e o aparelhinho bipou três vezes. Como eu disse, a vida quase nunca é como os filmes. A gente quase nunca consegue o que quer. É muito raro a gente dizer uma frase de impacto, ou inventar uma dança numa festa que todo mundo dance igual. Quer dizer, quantas vezes você já disse uma coisa pensando que era engraçada ou maneira e depois ninguém gostou? Quantas vezes você já tropeçou enquanto caminha? Quantas vezes você já fez um discurso improvisado e ganhou o respeito e afeto de todo mundo com esse discurso? Entendeu?

Ainda assim, de vez enquanto acontece. Coisas como a coincidência enorme que estava para acontecer. A triste, infeliz, coincidência. O cara na roupa de contenção apontou para nós quatro e disse:
-Os quatro estão contaminados. Podem chamar os próximos.

E a gente nem soube se tínhamos o vírus ativo ou éramos só portadores. A gente só soube que, no momento seguinte, mãos fortes pegaram nossas costas e nos empurraram, enquanto, sob mira de arma, nós fomos levados para a ruela que fica atrás do meu prédio.

sábado, 12 de dezembro de 2009

Capítulo 3- A Primeira Vez

Eu entrei pela porta aberta pela Vany e ouvi um barulho estranho vindo do quarto. Um barulho de luta. Corri diretamente para lá, temendo o que eu ia encontrar. Eu não fazia ideia do que estaria lá e a ideia do zumbi na reportagem tinha realmente entrado na minha cabeça. Imaginei as cenas mais horríveis ao entrar no quarto. O que eu vi não ficou muito atrás. A vó da Vany se encontrava deitada no chão, respirando débilmente, a Vany chorando, descontrolada, terrivelmente assustada, caída ao seu lado. Mas obviamente minha visão se voltou diretamente para o atacante. Um homem. Pálido. Meu vizinho. Já o havia visto algumas vezes no elevador. Ele estava usando uma camisa social branca, rasgada no ombro, uma marca de mordida humana à mostra. Sua boca estava suja de sangue e sem alguns dentes. Em seu pescoço, uma agulha de tricô, de aço (que eu reconheci como sendo de Dona Valquíria, avó da Vany) estava fincada. Você já deve ter visto imagens ilustrando zumbis. Você já deve ter visto filmes com zumbis. Você já deve ter jogado jogos com zumbis. Todos nós também. Mas nada se comparou a ver um zumbi na nossa frente. Seus movimentos eram irreais, seu rosto com uma expressão animal. Havia algo que o diferenciava de uma pessoa normal, ou de uma foto. A gente sentia que ele não estava vivo. Não sei como, mas a gente sentia. Olhar naqueles olhos era como olhar nos olhos de um animal empalhado. Vazios. Causava uma sensação de desespero, um mal-estar terrível. Eu acho que nunca vou esquecer daquilo. Foi a primeira vez que eu vi um zumbi ao vivo e a cores. Pedro estava o prendendo contra a parede, o antebraço pressionando seu pescoço. Eu soltei um grito ao ver a cena. Pedro lutava contra o zumbi pelo controle da situação e eu tinha que fazer algo para ajudá-lo, mas... O quê? Eu percebi Ivan parado ao meu lado. Olhei para ele, esperando uma ideia, mas ele ficava olhando para frente como se são estivesse vendo nada.

Eu gritei, esperando uma resposta de quem quer que fosse:
-O que eu faço, porra?!
Pedro gritou em resposta:
-Pega a cadeira!
Eu olhei. Em frente à escrivaninha que ficava ao lado da cama de casal, havia uma cadeira, com um kit de tricõ em cima. Um kit que faltava uma agulha. Eu quase sorri. Quase. Peguei a cadeira e virei erguendo-a alto. Pedro largou o zumbi, saindo da frente e eu acertei a cabeça dele com um dos pés da cadeira. Os outros acertaram a parede e quebraram. O filho da mãe não parou. Ele tentou avançar em mim, mas eu coloquei o assento da cadeira na frente e derrubei ele. Me abaixei e peguei um dos pés da cadeira e pulei em cima do zumbi, cego de raiva e adrenalina. Lembrando com calma, foi pura sorte eu não ter levado uma mordida enquanto lutava para me sentar em cima do tronco do zumbi e prender seus dois braços. Acho que conseguie, em parte, pela sequela (qualquer que tenha sido) que a cadeirada deixou nele. Subi em cima dele e golpeei seu rosto com ferocidade. Estava cego. Meu braço ia e voltava, golpeando furiosamente. Eu chorava de raiva, as mãos tremiam enquanto eu quebrava os dentes, depois o nariz, depois o maxilar, o crânio e cada parte dura daquele rosto maldito. Eu continuei golpeando, sangue espirrando em minha camiseta e em meu braço. Eu ouvia o estalar dos ossos e só. Eu via o espirrar do sangue e mais nada. Eu nunca tinha ficado com tanta vontade de destruir algo na minha vida. Foi Pedro que, de repente, segurou meu braço. Eu levantei e, tremendo, vi o que eu havia feito. Uma piscina de sangue em volta de um resto de cabeça. Eu joguei a perna de cadeira fora. Olhei para minhas mãos. Corri para o banheiro. Naquele momento eu me esqueci completamente da avó da Vany morrendo, dos zumbis, dos militares. Eu cheguei no banheiro e tranquei a porta. Achei que fosse vomitar, estava tremendo. Eu gritei. O mais alta e longamente que meu fôlego permitia. Me lavei com nojo. Me olhei no espelho por vários minutos. Expliquei para mim mesmo que eu não tinha matado ninguém, que aquilo já estava morto, que eu tinha salvado meus amigos. Depois de pouco tempo, eu fui me acalmando e a ideia foi entrando melhor em minha cabeça. Eu tinha feito a coisa certa. Era hora de sair novamente.

Capítulo 2- O Cerco

Tudo começou muito rápido. As imagens e logo em seguida, helicópteros. Dava pra perceber que o problema era mais sério do que parecia. Que a mídia tinha abafado o caso. Dava pra ver pela janela os helicópteros pousando e, de longe, caminhões vindo. Soldados desciam dos helicópteros, todos armados com armas negras e ameaçadoras, provavelmente semi-automáticas. Um dos soldados pegou um alto falante e começou a gritar para os moradores do meu prédio:
-Atenção! Uma infecção nova foi registrada como perigosa. Há um foco localizado nesse bairro. Mantenham a calma! Vocês não estão autorizados a sair desse bairro e a equipe está aqui para realizar testes para descobrir os portadores do vírus, que serão imediatamente levados ao atendimento! Aqueles que estão saudáveis serão escoltados para fora daqui e poderão visitar seus parentes infectados mais tarde. Iremos fazer a chamada após cada verificação, andar por andar de cada prédio.-Percebemos que, na frente do vizinho, outro soldado dizia mais ou menos as mesmas palavras- Não queremos contato com aqueles que têm suspeita do vírus! Sair antes de seu número de chamada pode ser perigoso! Eu repito: Sair antes de sua convocação pode ser perigoso! Permaneçam onde estão e cooperem que tudo ocorrerá bem! Caso algum andar não coopere, nós temos ordens de invadir o andar e levá-los à força!

Eu sabia que havia algo de errado, mas não conseguia perceber o que. Ivan sentou-se e tentou se acalmar. Pedro começou a ficar impaciente: Ele não gostava de ficar esperando até que outros o dissessem o que fazer. Eu via ele se levantar e dar uma volta na casa, mexer nos armários, enquanto eu tentava, em vão, descobrir o que me deixara desconfiado dos militares. Ivan estava claramente tentando se controlar, mas suando muito e nervoso á beça. A Vany parecia em estado de choque, quando, de repente, ela arregalou os olhos e disse:
-A minha vó. Temos que subir para buscá-la. Ela deve estar desesperada!

Não precisamos falar mais nada. Como que num único instinto humano, fomos os quatro para a porta. Todos sentiram que deveriam subir juntos. Então, um pensamento me atingiu. Rapidamente, parei, antes mesmo de abrir a porta. Eu virei para eles e, olhando para o chão, eu disse:
-Não podemos ir.
A Vany começou a gritar:
-Hugo, isso não é hora pra brincar.-Ela tentou pegar a chave da minha mão, mas eu segurei a chave firme- Me dá essa droga logo, abre essa porta!
Ainda evitando olhar nos olhos deles, eu disse:
-Não.
Pedro suspirou.
-Como não?-Perguntou ele.
Eu olhei para os olhos dele, firme.
-E se o que a vó da Vany tiver for exatamente o vírus que os militares tão procurando?
A Vany me deu um tapa, ficando vermelha rapidamente. Uma lágrima caiu quando ela me acertou. Só uma. Ela murmurou, parecendo muito mais ameaçadora agora, falando baixo, do que antes, gritando:
-Hugo Mendes de Oliveira. Não se atreva a ficar no caminho entre eu e minha família.- Ela fez uma pausa e continuou- Não se atreva a insinuar que minha avó está em perigo. Me dá essa chave. - Eu hesitei- Me dá essa chave!- Eu entreguei a chave para ela. Claro, a avó dela poderia ter só uma gripe normal, mas seria muita coincidência, não seria? Ela me empurrou para fora do caminho e abriu a porta. Eu estava muito confuso para me preocupar se eu tinha sido insensível. Extremamente insensível. Agora que escrevo isso eu percebo como eu fui idiota. Nem percebi Pedro e Ivan passando por mim. Quando me dei conta, Ivan estava me chamando, do outro lado do corredor. Lentamente, eu fui atrás deles. Dava para ouvir os passos da Vany correndo para subir os cinco lances de escadas que a separavam de sua casa. Ivan esperou por mim e subimos juntos. Ele murmurou, desconfortável:
-Você acha que pode ser o mesmo vírus?
Eu pensei. A resposta era óbvia. Eu só tinha sido um idiota de colocar as coisas daquela maneira, tão súbita, tão insensível. Mas os fatos eram os fatos. Havia uma grande chance, sim, da avó da Vany estar contaminada. Todos nós estávamos demorando pra absorver o impacto de tudo. Foi só depois que entramos no apartamento da Vany que caiu a ficha. Que a verdade nos atingiu e sentimos, efetivamente, o quão grande era a merda que tínhamos nos metido. Foi lá que nós vimos nosso primeiro zumbi.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Capítulo 1- O Começo do Fim

Eu me lembro exatamente de como tudo começou. De como nós saímos da nossa vida confortável de adolescentes para o Inferno. Meu irmão foi para a praia passar o feriado com os amigos. Minha mãe viajava a trabalho. Meu pai morava no Rio de Janeiro. E eu tive a genial ideia de chamar meus amigos para virem dormir aqui em casa. Tinha comida o suficiente para eu e meu irmão. E meu irmão come pra caramba. Chamei eles para o final de semana prolongado. Além da comida, havia o dinheiro que minha mãe deixara para emergências. Já havia chamado a Vany, 3 andares acima. A avó dela era bem gente boa e, por isso, deixou sem problemas. Além dos mais, estava gripada. Não queria passar o que quer que tivesse para a neta. Ela me conhecia bem e sabia que eu faria qualquer coisa pela Vany. Então nós alugamos um monte de filme de terror, compramos meia dúzia de pacotes de pipoca e ficamos todos embaixo da coberta, assistindo os filmes seguidos, virando a noite, enfim. Foi segunda feira de manhã, feriado, que passou no Noticiário Matinal. O âncora puxou a notícia com seriedade e uma repórter começou a falar num hospital não muito longe de casa, enquanto, atrás dela, médicos estudavam um cadáver. Algo sobre um vírus. Uma espécie nova. E então, de repente, com um buraco na barriga, o cadáver se levantou. Eu lembro o que aconteceu. O câmera continuou filmando, mas a mídia cortou. Ivan ficou só olhando, olhos arregalados, boca aberta. Eu lembro de ter procurado a mão da Vany, para encontrar conforto, mas ela já tinha levantado para ir ao banheiro vomitar. Pedro só sorriu. Eu corri atrás da Vany enquanto o âncora falava algo sobre tomar cuidado com possíveis ataques de agressores e evitar qualquer contato com os tais. A Vany se encontrava dobrada sobre a privada, colocando comida pra fora. O meu estômago começou a afundar. A Vany começou a chorar baixinho e eu cheguei do lado dela, sentei, abracei ela e limpei o seu rosto com um pedaço de papel higiênico. Ela perguntou:
-O que foi aquilo?

Eu não sabia o que dizer. Não sabia o que pensar. Eu não sabia o que era aquilo. Eu não sabia o que fazer. Não sabia que barulho alto era aquele que eu ouvi do lado de fora da janela. Não sabia sobre o que Ivan e Pedro conversavam na sala. Eu queria dizer pra ela que não fora nada, mas as imagens da TV ainda gravadas em minha mente me impediam de mentir. Eu queria dizer pra ela que não ia acontecer nada, mas o barulho agora reconhecível de helicópteros me impedia de fazê-lo. Eu queria dizer pra ela que ia ficar tudo bem, mas eu já não tinha tanta certeza assim. Eu queria dizer para ela que era só um engano, uma brincadeira. Mas o que eu disse foi a primeira coisa que me veio na cabeça. podia até ser uma opinião errada, mas a palavra me saltou a mente no momento e eu não pude contê-la. O que eu disse foi:
-Eu acho... Eu acho que aquilo era um zumbi, Vany.

Prólogo

Eu não sei o porque disso estar acontecendo. Eu não sei se foi uma falha humana num laboratório, ou se foi um vazamento de lixo com perigo biológico ou qualquer merda dessas; também não me interessa. A causa disso não vai mudar nada os fatos. Eu sei que a cidade foi isolada e depois evacuada. E logo vão destruir tudo. Eu não tenho culpa disso. Mas é claro que os militares, em sua corrida desesperada para se salvarem, esqueceram de fazer um bom trabalho ao recolher os civis. Minha mãe estava viajando a trabalho. Meu pai mora em outra cidade. Eu sou só um adolescente de 15 anos preso aqui com essas merdas desses zumbis. Ninguém mais entra ou sai da cidade. Podemos ser portadores do maldito vírus mas não manifestar a doença. Merda. Eles teriam que ter certeza de que eu estou livre do vírus pra me levar pra fora novamente... Eu não sei o que fazer. Na minha vida normal era para eu estar na escola com meus amigos, azarando as meninas, zoando com os colegas, me matando de estudar pras provas... Parece que faz tanto tempo...

Agora eu não lembro de quem foi a ideia de escrever sobre o que aconteceu com a gente. Acho que a gente precisava registrar o que já tinha acontecido. Não dá pra passar pelo que a gente passou e simplesmente morrer depois. Acho que, principalmente por causa dos nossos pais lá fora, a gente precisava registrar o que tinha acontecido. Nós mesmos. Com o nosso ponto de vista. Eu fui escolhido em consenso. Acho que me escolheram porque sou eu que escrevo melhor no grupo. Bem, vamos começar isso efetivamente, ok? De que serve uma história sem personagens? Vou me apresentar e a cada outra pessoa do grupo em ordem aleatória.

Meu nome é Hugo Mendes de Oliveira, eu sou um garoto de 15 anos. Sou magro, altura mediana, cabelos pretos e olhos escuros. Tenho um nariz saliente, eu acho meio feio, mas é uma característica minha. Sem ele, meu rosto não seria mais... O meu rosto, certo? Enfim, eu não sou feio, mas também não sou muito bonito. Sou muito fácil de derrubar, às vezes caio sozinho. Meus braços são relativamente fortes, pra alguém da minha idade, mas é só. De resto eu sou normal, fisicamente. Eu sou ator. Sou uma pessoa simpática e animada. Raramente me estresso, mas quando me estresso, geralmente é por algo bobo. E quando eu me estresso, eu me estresso MUITO. Sou bom em inglês, aliás, sou bom em aprender basicamente qualquer coisa. Não sei, eu tenho uma facilidade enorme para entender as pessoas e o que elas querem dizer...

Outro no meu grupo é o Ivan. Ivan de Lara Verite, 16 anos, nerd. Basicamente. Ele adora Senhor dos Anéis, Star Wars e Asterix; nunca se deu bem com garotas e tem muitas peculiaridades estranhas. Ele é teimoso pra caramba, o que sempre me irritou. Mas tem alguma coisa nele que me acalma, ao mesmo tempo. Ele é um cara calmo. Nunca vi ele estressado, na época das nossas vidas normais. Ele tem cabelo encaracolado e preto, tem um nariz largo e achatado e uma pele levemente morena. Ele é mais magro que eu e eu nunca consegui imaginá-lo numa luta. Quer dizer, antes dessa merda toda acontecer...

Tem outro amigo meu, Pedro. Pedro Bettega Teixeira, 16 anos. Alto, loiro, magro, olhos azuis, voz grossa... Já ouvi histórias de garotas que seguiram o Pedro no shopping. Apesar de tudo, ele é um cara espontâneo, despreocupado e gente boa. Aliás, tem vezes que ele me assusta. Ele definitivamente não é normal. Não estou dizendo que tenha problemas, mas ele encara a morte com uma gozação não natural. E isso me assusta. Muito.

A terceira e última pessoa é a Vany. Vanessa D'Avila, 16 anos(Por que eu sou o mais novo?). Minha vizinha e companheira para todas as atividades, ela sempre foi uma pessoa meio transitória. Ia rapidamente da felicidade à tristeza, do amor ao ódio. Passional ao extremo (ou amava ou odiava, ela não podia simplesmente gostar ou não gostar) e muito animada, desde que nos vimos, foi amor à primeira vista. Fomos feitos um para o outro. Não como romance, não. Mas a gente... A gente combinava. Eu lembro como ela costumava dizer que eu era "Namorado demais pra ser só amigo e amigo demais pra ser namorado". Sinto falta da época que ela podia dizer essas bobagens. Que a gente ria à toa, juntos. Ela tem cabelos escuros, olhos verdes muito claros e um rosto redondo e bochechudo. É pálida, magra e tem uma voz melodiosa. Ela teve um passado parecido com o meu e isso fez a gente se unir mais ainda. Espero que sobrevivamos até o fim disso.


Enfim, esses são os "personagens" da nossa história. E claro, essas são as minhas opiniões sobre eles ANTES do acidente. Antes dessa merda desse cheiro de podridão empestar nossas roupas, nossas casas... Nossas vidas.