quinta-feira, 22 de abril de 2010

Capítulo 27- Cães do Inferno

Todos sabíamos o que tínhamos que fazer agora. Precisávamos ir atrás de Ricardo, principalmente por que a Raquel estava conosco, e cada vez mais difícil de controlar. Houve uma pequena discussão sobre quem ficaria sozinho na casa. Raquel queria muito ir atrás do pai e eu relutava em deixar o Pedro sozinho. Mas sem mim, a Raquel não iria. Pedro ainda não tinha ganhado a confiança dela, ela preferia ir comigo. E Pedro também não tinha muita paciência com as outras pessoas e, provavelmente, iria preferir ir comigo. Ficamos numa discussão até que Pedro se voluntariou pra ficar na casa, pois estava cansado, tanto física quanto emocionalmente. Queria se isolar disso por um tempo. Eu e Raquel procuramos armas, mas não tinha muita coisa. Aquela faca de cozinha, uma perna de mesa que tinha quebrado no tira e põe; e só. Eu fiquei com a perna da mesa, ela com a faca de cozinha. Saímos pela porta da frente. Fizemos um esquema diferente, essa era uma missão de resgate, nós éramos os predadores, não as presas´. Além disso, tínhamos uma mobilidade muito maior do que antes, porque estávamos em apenas dois. Fomos juntos, lado a lado, ela olhando para trás, eu checando em frente. Íamos reto, sem nos esconder. Zumbis passavam por nós e esticavam os braços, nós acelerávamos. Volta e meia achávamos um grupo maior. Graças a Deus que a noite estava clara, senão estávamos ferrados. Tentei pensar aonde Ricardo iria procurar por Raquel. Ele devia ter algum esquema, um mapa ou algo assim. Tentei lembrar de alguma informação que revelasse isso... Nada. Seguimos em frente. Então aconteceu. Eu ouvi um latido e um rosnar e então, três cachorros saíram de um beco. Eu não ia esperar pra descobrir se estavam infectados ou não. Puxei Raquel e comecei a correr. Eles eram muito rápidos, logo estariam em cima da gente. Eu precisava entrar em um prédio, subir em alguma coisa, sei lá. Eu virei uma rua, puxando Raquel junto comigo. Então eu ouvi uma voz familiar, gritando, vo outro lado de um parque:
-AQUI! AQUI!

VANY!! VANY!!! Era ela! Eu olhei e vi alguém acenando com os braços pro alto, a um parque de distância da gente. Eu fiquei feliz. Nós continuamos a correr. Então eu vi um pequeno grupo de zumbis indo até o local, iriam pegar ela por trás. Eu arregalei os olhos e ia avisá-la quando saiu um cara de dentro do prédio que estava atrás dela. Ele ergueu um revólver rapidamente e começou a despachar os zumbis um por um, enquanto a Vany se escondia atrás dele. Ricardo! Era ele, eu tinha certeza! Eu e Raquel corríamos. Então ela caiu. Merda. Eu parei e voltei, dando com a pesada perna de madeira maciça na cabeça do maior dos cachorros que estava na frente, com toda a minha força. Ele levantou no ar e caiu pra trás, desfalecido. Eu não podia nem pedir ajuda pros outros dois, porque eles tinham os próprios problemas pra se preocupar. Raquel, no chão, lutou pra se levantar, eu tentei ajudá-la, mas tive que soltá-la pra meter o pedaço de madeira entre eu e o cachorro, que saltara para me atacar. O terceiro animal pulou em cima de Raquel, que estava no chão e indefesa, a faca caída a alguns metros dela. O cachorro que havia me atacado estava me encurralando com uma árvore e eu comecei a ofegar. Droga, Raquel e Ricardo estavam tão perto de se encontrar! E agora Raquel estava muito perto de morrer também, merda, merda, merda! Não, eu tinha que fazer alguma coisa. Eu não ia permitir que ela se machucasse! Num fluxo de adrenalina, eu ataquei o cachorro e ele pulou em cima de mim. Eu rebati ele com força e ele voou como uma bola de beisebol. Então eu corri para Raquel, soltei a perna de mesa para então abraçar o cachorro por trás, erguendo-o e o atirando para longe. Ele caiu de lado, rodou e levantou-se partindo pra cima de nós novamente. Eu corri até ele, me sentindo selvagem. Mais livre do que jamais estive. Ele pulou em cima de mim com a boca aberta e eu girei, deixando-o cair um pouco à minha frente. Ele ia virar e me atacar novamente, mas eu pulei em cima dele, prendendo-o no vão de meu braço, num mata leão. Pressionei com força, mais força do que eu achei que teria. Ele parou de se mover, pouco tempo depois. Eu levantei-me e suspirei, feliz, leve. Nunca tinha sentido tanto prazer em matar alguma coisa...

terça-feira, 6 de abril de 2010

Capítulo 26- Ivan de Lara Vérité

Eu pensei nisso tudo. Mas o que eu queria era que tudo isso se explodisse... Não me importava. O que importava é que eu nunca mais veria o Ivan. Eu nem cheguei a me despedir. E ainda por cima, eu me culpava. Pedro depois pediu desculpas, havia me culpado de cabeça quente, mas eu ainda sentia a ausência do Ivan. A sua não-presença, com a qual eu teria que aprender a lidar depois. Depois. Agora, eu só queria lembrar. Lembrar de como nós fomos colegas por muito tempo antes de nos tornarmos amigos de verdade. Lembrar de como o conheci, nossa primeira conversa, as noites lá em casa, do dia em que eu o apresentei à Vany, das risadas entremeadas por tosses, alegres tosses, que ele dava. Das histórias, dos projetos, do sentimento de calma e segurança que ele me passava.

-Ele me salvou- Disse Pedro, fitando o nada. Eu tinha acordado há pouco tempo, muito triste pra levantar da cama, as luzes já acesas no interior da casa. E Pedro estava lá, sentado ao meu lado na cama, olhando para o canto do quarto como se fosse uma televisão. Tínhamos ficado quietos até que ele disse isso. Ele pausou um momento e continuou.- Nós estávamos rodeados de zumbis, eu abri um caminho. Nós tentamos fugir por um tempo, mas eles estavam nos alcançando. Daí o Ivan parou, respirou fundo e disse que ia tirar a gente dessa. Que era o único jeito. Eu não entendi nada e ele me mandou correr. Ele disse que tudo bem, que isso era parte do plano dele. Ele me mandou correr para longe que ele ia me salvar. Ele ia atrasar os zumbis. Eu não sabia o que fazer- Ele fungou- Mas ele me empurrou pra longe e já haviam zumbis chegando. Eu caí no chão e um zumbi chegou por trás dele e mordeu seu ombro. Eu saí correndo pro outro lado. Ele deve ter matado uns três pelo menos. Filhos da puta...

Eu fiquei olhando pra ele: olhos aguados, tentando esconder a profunda tristeza que sentia. Ele levantou e foi embora. Eu fiquei refletindo. Muita gente diz que morreria pra salvar outro, mas, no fundo no fundo, sabe que não é verdade. São poucos aqueles que se sacrificariam por uma outra pessoa assim, de repente, sem nem garantia de que o outro vai sobreviver. E Ivan o fez. Toda a implicância que nós tínhamos com ele, é desnecessário dizer, desapareceu. Corajoso. Esse era o adjetivo que o designava. E eu decidi parar de chorar e começar a tentar respeitar ele, seguindo seu exemplo. A partir de agora, era hora de me acalmar, começar a matar zumbis planejadamente, com segurança, pra garantir o maior estrago possível na população deles. Era hora de começar a me preocupar com os outros sobreviventes e começar a me sacrificar por eles também. Era hora de fazer a diferença. Eu levantei, um brilho determinado em meu olhar. Era hora de começar a ser corajoso.