sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Capítulo 35- Divórcio

Caminhamos por um bom tempo, em silêncio fora os pequenos comentários dirigidos à Marina. Eu senti, o caminho todo, uma tensão enorme, principalmente porque o sol começava a sumir no horizonte. Estávamos desarmados, carregando uma criança no colo e tentando protegê-la de tudo que estava acontecendo à sua volta, fosse um zumbi, fosse um acidente de carro, fosse um mero cadáver. Mero cadáver. Eu estava começando a me acostumar com o sangue. Com a violência. Com o cheiro. Com a pressão. Com essa parte toda. Que merda. Isso é horrível, horrível mesmo. Você olhar pra alguém que morreu, provavelmente de uma maneira terrível, e não sentir nada. Talvez a Vany estivesse com razão... Talvez eu estivesse ficando frio mesmo. Mas isso era essencial para a nossa sobrevivência. Não dá pra sobreviver sendo emotivo. Não dá pra demonstrar compaixão por todos. A Vany claramente não pensava assim. Ela virava o rosto e tentava segurar o choro, toda a vez que passávamos por uma cena dessas. Eu nem sentia mais vontade de chorar. Eu lembrei de quando deixamos o soldado pra morrer na rua atrás de casa, de como nos sentimos mal. E pensei sobre o quanto tínhamos mudado. O quanto tudo tinha mudado. Mal fazia uma semana que a invasão tinha começado. Que nossas vidas se transformaram pra sempre. E nós estávamos tão absortos nisso que nem percebemos a mudança. Nem paramos pra pensar nas coisas que estavam acontecendo.

***

Não dissemos muita coisa enquanto chegávamos no lugar. Não dissemos muita coisa enquanto barricávamos o portão. Não dissemos muita coisa enquanto preparávamos o lanche e nem dissemos muita coisa enquanto nos sentávamos para dar de comer para a Marina. Não falamos muito, em geral, e o silêncio entre nós só contribuia para me deixar mais estressado. Isso só foi quebrado quando colocamos ela para dormir. O lugar era uma casa grande, com muros altos o suficiente para barrar os zumbis, mas baixos o suficiente para escalar. Usamos o tapete de entrada de uma das outras casas para passar pelo arame farpado, jogando-o por cima dele. A porta tinha sido deixada aberta. O maior perigo era a grande porta da garagem, um portão automático metálico, pintado de verde, porém não parecia resistente o suficiente para conter dezenas de zumbis famintos. Assim, barricamos o portão. Mas, enfim, o que eu queria dizer é que era uma casa grande, o que deu direito a um quarto só para Marina. Nós dormiríamos no quarto do casal. Deitamos Marina na cama, e ela, agitada, não conseguia dormir. Tentamos acalmá-la de várias maneiras, até que ela nos disse:
-Quero uma história.
"História?" Eu pensei "Temos que dormir logo, para estarmos descansados amanhã."
-Olha, Marina, eu não sei... Eu não conheço nenhuma história.
A Vany me interrompeu, dizendo:
-Então deixa que eu conto.
Eu engoli em seco e disse, tentando aliviar a tensão:
-Vou fazer a vigia.
Levantei e fui em direção à porta. Parei quando ouvi a Vany dizer:
-Depois eu falo com você.
Eu saí do quarto, sem poder deixar de notar o quanto a Vany parecia minha mãe quando falava assim. Preocupado, fui para o segundo andar da casa, onde um par de binóculos me aguardava para a vigia. Enquanto acompanhava o movimento débil de ocasionais zumbis sem muito interesse, comecei a me preocupar mais e mais com o jeito que a Vany falou que precisava falar comigo. "Depois eu falo com você." Boa coisa não podia ser.
Pouco tempo depois, ouvi uma batida na porta que levava às escadas. A porta se abriu e a Vany me chamou enquanto eu tirava o binóculo do pescoço. No quarto, que ficava longe do quarto da criança (do outro lado do corredor), ela disse:
-O que está acontecendo com você?
Eu, meio que por reflexo, disse:
-Como assim?
Ela respondeu:
-Esse não é o Hugo que eu conhecia. Você mudou. O Hugo por quem me apaixonei teria feito qualquer coisa para alegrar ela. Cadê a sua compaixão? Ela é uma criança, pelo amor de Deus! Você não pode agir assim com ela! O que foi que aconteceu?
Eu, irritadíssimo, respondi:
-O que aconteceu? Essa porra toda aconteceu! Os zumbis aconteceram! Essas frescuras de vocês têm que parar, isso sim! Histórinha pra dormir, no meio de uma invasão de zumbis?! E você, chorando toda a vez que vê um cadáver?! Porra, isso é perda de tempo. Eu tô pensando numa maneira de sair daqui, de nos salvar, e você vem me falar sobre delicadeza?! No meio de uma invasão de zumbis?!
-Uma coisa não exclui a outra!- Ela respondeu, chorando.- Eu não acredito que tô ouvindo isso! Eu não mudei! EU não mudei! Por que você tem que mudar?!
-Eu me adaptei à situação. Você devia começar a aceitar que as coisas não são mais como antes.- Esbravejei.
A Vany me olhou com os olhos vermelhos, tremendo. Ela disse:
-Como você pode ser tão frio? Como você pode ser assim?! Como você se aguenta assim?! Eu não tô mais falando com o Hugo. Eu não quero mais você. Não quero mais olhar pra você, não quero mais falar com você, não quero mais nada com você. Você conseguiu estragar a única coisa boa que tínhamos por aqui, Hugo. Parabéns.
Peguei meu travesseiro e fui para o sofá da casa. A raiva tinha passado, de repente. Me senti culpado. Será que eu tinha sido duro demais? Será que eu estava errado? Não sei. Eu sei que queria muito, mais do que tudo, sobreviver a tudo isso. Durante uma invasão de zumbis, não se pode ter o luxo de amar. É preciso estar focado na sobrevivência, sempre. É o mais importante, não importa o preço. Agora, enquanto escrevo, percebo o quanto estava errado.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Novidades!!! - Importante

Galera, resolvi testar uma parada. Agora, na comunidade, há uma enquete nova que tem como objetivo tornar essa história um pouco mais interativa. Votando na enquete, você vai influenciar na história, só não vou deixar bem claro em como ela vai se alterar. Mas, enfim, esse mistério sobre como ela vai alterar é mais pra ter a opinião real de vocês, sem que ninguém vote no que acha que seria "mais legal pra história". O que quer que aconteça depois disso pode ou não ter sido influenciado pela enquete, e todo o bem ou mal que as decisões de vocês causarem serão diretas consequências da escolha que vocês fizeram. A enquete se chama "O que você acha mais importante?", tem apenas duas opções e ficará aberta até 15 de Novembro. No tópico "Notícias do Autor" há uma nova postagem falando sobre ela, dêem uma olhada, ela também é importante. Conto com a participação de vocês. Já fica avisado que ambas as opções têm suas vantagens e desvantagens futuras dentro da história, e o próximo capítulo só vai sair depois que a enquete fechar.


Make choices. Face the Consequences.
"Escolha. Enfrente as consequências."

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Capítulo 34- Problemas

Não havia respingos de sangue na parede. Ele levou o tiro deitado. Não havia sinais de mordidas no corpo. Não fora suicídio, ainda mais agora que havia reencontrado a filha. Ele foi executado cruelmente. Um tiro na garganta, sangrou até a morte. Mas por quem, e por quê? Eu suspirei, enquanto olhava para os olhos aguados da Vany.
-Ele foi assassinado. Não sei o motivo.

Ela deixou algumas lágrimas caírem, eu me aproximei, murmurando:
-Vany... Nós... Nós não podemos ficar aqui. É muito perigoso.

Ela me empurrou para longe, dizendo:
-Por que você é tão frio, Hugo?

Eu me surpreendi, dizendo, mais alto do que deveria:
-Eu!?

Ela entrou no quarto de Raquel, onde tínhamos deixado Marina, balbuciando algo sobre não aguentar mais. Eu balancei a cabeça, passando a mão pelos cabelos. Agora essa. Ela queria dizer que eu era frio? Logo eu? Poxa, depois de tudo que demonstrei, depois de ter ajudado não só ela, como a Raquel e o Pedro, depois de ter ficado um tempão mal por causa do Ivan, depois de tudo o que fiz pelo grupo, ela tava me chamando de frio? Frio era quem matou o Ricardo. Filho da puta. Ele num ia ter nem um enterro decente. E tudo aconteceu nesse intervalo ridiculo de tempo, enquanto íamos e voltávamos do mercado. Ivan e Ricardo. E a gente nem sabia se o Pedro e a Raquel tavam bem, o Pedro com aquela perna dele... Não tínhamos pra onde ir. Não tínhamos armas nenhuma, éramos dois adolescentes em clima de tensão cuidando de uma garotinha de 4 anos. Que droga. Mas que não dava mais pra ficar ali não dava. Primeiro roubaram a casa inteira. Agora invadiram e atacaram os três, sei lá porque. Tínhamos que ir pra algum lugar, onde quer que fosse. Resolvemos ir para o lugar onde a Vany ficou qdo se separou de nós. Pouco tempo depois saíamos da casa rapidamente, sem muitas palavras proferidas.