domingo, 14 de fevereiro de 2010

Capítulo 21- Caos

A gente dobrou algumas ruas e fomos andando vagarosamente e em silêncio. As ruas vazias a não ser por carros abandonados para trás na correria da evacuação. A gente não sabia dirigir e, se soubesse, não seria muito aconselhável, por que iria atrair muita atenção. Se bem que seria muito melhor, por causa da perna machucada do Pedro. Mas, enfim, a realidade era outra. Se eu pudesse escolher a realidade, a gente nem ia precisar saber dirigir um carro, muito menos ter que amparar o Pedro por aí. O grande problema da perna do Pedro é que tirava a nossa velocidade. Com ele machucado daquele jeito, a gente não tinha como fugir de zumbis, tínhamos mais ou menos a mesma velocidade deles. Por isso fomos tentando nos esconder, do melhor jeito que deu. A gente não tinha um destino certo, então o plano era perambular pelas ruas procurando as duas meninas, sem ser visto pelos zumbis, até cansar. Enfim, é claro que ia acabar dando errado.

***

E deu. Estávamos andando em uma rua qualquer por ali prédios cercando os dois lados, quando nós avistamos um grupo. Uma roda de zumbis. Deviam ter uns 30, mais ou menos, todos voltados para o que parecia ser um carro capotado. Comendo alguma coisa. Eu apertei a faca na mão e virei para os dois para avisar, quando ouvi um barulho. De repente, uma latinha de cerveja voou e caiu, fazendo um barulho que, aos nossos ouvidos já acostumados com o silêncio, pareceu um estardalhaço. Eu percebi que o barulho veio de trás de nós, da longa rua que se estendia para o outro lado. Eu virei para olhar e vi: Outro zumbi, gemendo, os braços erguidos em nossa direção. Alguns dos outros zumbis se viraram para a nossa direção com o barulho, mas nem todos. Esses viraram-se e vieram se arrastando no seu ritmo lento para cima de nós. Tínhamos que ser rápidos e silenciosos, ou iríamos atrair o resto da turma. Ivan estava parecendo bastante nervoso, murmurando coisas que eu não entendi. então eu virei para o Pedro, que compartilhava meu ódio mortal por zumbis, e disse, meio que brincando:
-Você quer o prato principal ou só o aperitivo?
Ele sorriu e respondeu:
-O prato principal.
Eu virei para o único zumbi que vinha andando. Então, com meu olho, percebi que um zumbi se levantava detrás de um poste e outro dobrava a esquina em frente, certamente atraídos pelo barulho da lata. Eu corri até o primeiro zumbi e, me abaixando para escapar das suas mãos desmortas, eu enfiei a faca ao lado do seu joelho e puxei, arrebentando um dos dois tendões com certa dificuldade. Ele segurou meu ombro esquerdo e se abaixou para me morder. Eu me esquivei rolando pro lado desajeitadamente. Ele começou a se arrastar, mais lentamente que o normal, atrás de mim. Eu me levantei e dei uma olhada para os lados. Um dos zumbis estava logo á minha esquerda, mãos estendidas, guinchando sobrenaturalmente para mim. Ele me segurou e pe puxou com força, abrindo a boca, os olhos saltados fixos em mim. Eu tentei. Eu enfiei a faca na garganta dele com força e empurrei ele pra longe. Mas ele tinha me pegado num abraço. Com dificuldade eu empurrava ele para longe, enquanto eu sentia o hálito horrível e quente dele atingir meu rosto, fazendo meu estômago revirar. A boca dele estava aberta a centímetros da minha cara. Nem tentei me soltar. Se eu tentasse, ele ia acabar me mordendo, porque eu ia soltar a faca. Então eu tive a ideia. Eu comecei a fazer força para cima com a faca e fui abrindo o pescoço dele até o queixo. Ele não pareceu se importar. Com um salto, me impulsionando para frente, a faca presa no maxilar dele, eu derrubei ele no chão com força, o impacto entre o chão e a cabeça dele, sendo o suficiente para a faca arrebentar o osso do maxilar dele, fazendo mais sangue espirrar por aí. Eu estava montado em cima de um zumbi inofensivo. Nunca mais iria morder ninguém. Eu retirei a faca do meio da boca dele e segurei ela à frente dos meus olhos. Ela também tinha entortado com o impacto com o chão. Sem faca pra mim. Eu senti mãos pegarem meu braço direito e o levantarem. Com força, eu dei uma cotovelada na boca do zumbi que estava o segurando. Foi pura sorte ela estar fechada. Eu vi dois dentes caírem enquanto ele abriu a boca. Merda, meu braço estava praticamente dentro da boca dele. Aí, puxaram meu outro braço com força e eu me impulsionei com as pernas para o lado que o puxaram. O zumbi que segurava meu braço direito mordeu o ar, enquanto o outro, que tinha me puxado, tinha sido derrubado pela minha força somada à dele. Pensei em Pedro e Ivan, mas não me arrisquei a olhar para onde os dois estavam. Eu caí no chão em cima do novo zumbi, que fez um barulho com a garganta e tentou me morder, mas eu já estava me levantando. O outro zumbi (uma mulher, por acaso) já estava na minha cola. Eu saltei e dei um chute na garganta dela, enquanto ela se impulsionava pra frente pra me morder. Ela levantou no ar, virou e caiu no chão. O outro zumbi, que já estava no chão, pegou meu tornozelo esquerdo e eu pisei com o pé no braço dele enquanto tirava meu tornozelo do aperto da mão cadavérica. Ele tentou então morder o tornozelo que estava em cima do braço dele, mas eu pulei, caindo com um pé em cima da cabeça dele, escorregando e caindo de costas no chão novamente (eu disse que eu caio fácil, lá no prólogo, lembra? Maldita labirintite) Eu caí com a parte detrás da cabeça primeiro, o que doeu um bocado. Isso, juntando com a minha labirintite e meu ferimento recente no crânio (coronhada do Ricardo), fez minha vista escurecer. Eu levantei rápido e aí minha pressão caiu. Só aí eu desmaiei. Por uns segundos só. Caí de cara no chão. Acordei com sangue escorrendo do nariz e uma dor filha da puta no lábio. Me coloquei em posição de flexão pra tentar me levantar. O zumbi que estava caído à minha frente foi com a boca aberta com tudo nas minhas mãos enquanto eu me levantava. Eu me joguei para trás, acertando um outro zumbi na virilha com a parte detrás da cabeça. Esse zumbi caiu em cima de mim. Eu ouvi uns grunhidos atrás de mim, como se alguém estivesse lutando para se livrar do aperto de um zumbi. O zumbi que tentou morder minha mão acertou em cheio o asfalto, boca aberta e tudo. O zumbi que caiu em cima de mim, no entando, pegou minha perna. Eu senti a saliva dele roçando minha canela. E, apesar da minha luta, de todo o esforço que eu tive pra chegar até aqui, de tudo que eu tinha passado, dos meus chutes e joelhadas, ele me segurou. E me mordeu.